domingo, 16 de março de 2014

A mais longa noite (conto)


A cada manhã nascida, o sol deixava no quintal um ovo dourado. Eu os guardava no canto do chalé. Guardava-os sem me preocupar em saber a razão por que fazia aquilo.

Certo dia, o sol não nasceu.

A noite avançou até outra noite chegar, e mais outra noite avançar, cada vez mais escura, e assim sucessivamente, até que o breu ficou tão compacto, mas tão duro que nos sentíamos como que presos a imensos blocos de gelo negro.

Ninguém fazia nada. As crianças não brincavam; os adultos não conversavam; os bichos, igualmente, permaneciam inertes em seus cubos de gelo.

Algum tempo se passou.

Ouvi, de repente, um ruído à minha esquerda. Meus olhos, que jamais se haviam fechado, viram um brilho dourado num canto da casa. Lembrei-me dos ovos dourados.

Seria possível?

À medida que as horas corriam, os ovos iam explodindo, aquecendo o gelo negro, a ponto de derretê-lo inteiramente. Luminoso amanhecer irrompeu. As crianças alegraram-se; os adultos tornaram a falar e os bichos deram o ar da graça.

Tudo voltou a ser como antes.
Manoel Soares Magalhães
Fonte: Cultive Ler

2 comentários:

Anônimo disse...

Que conto estranho e maravilhoso. Curto e extremamente significativo, cheio de possibilidades interpretativas. Não conheço o autor, porém me pareceu muito bom. Vou investigar.

Arthur Virgílio

Anônimo disse...

Bem misterioso... e encantador. Telma