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quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Day by Day, a versão gaúcha de Godspell

Graças a uma promoção do Emaús Pelotas, assistimos em 27 e 28 de outubro de 2007, pela primeira vez em nossa cidade, à peça “Day by day - a história que todo mundo conhece”, adaptação livre do musical de 1971 Godspell (palavra que em inglês equivale a “evangelho”, boa notícia).

O grupo porto-alegrense “Cantar a esperança”, que vem encenando esta obra desde 1985, sob a direção de Dayse Matias, satisfaz ao mesmo tempo objetivos artísticos e de evangelização, ao contar a história de Cristo de forma moderna, ágil e engraçada, sem perder o seu significado essencial. Em 2009, eles se apresentaram em setembro, no bairro porto-alegrense de Higienópolis (veja abaixo o cartaz).

A história que todos conhecemos é a do Jesus bíblico, desde o anúncio de João Batista até a Ressurreição. Quando já não o vemos flutuando nas nuvens, e sim cantando e dançando, jogando pétalas para a platéia e incluindo-nos entre os seus amigos, a imagem daquele mestre espiritual adquire nova vida e, mesmo já conhecendo a história, nos emocionamos ao vê-lo despedir-se, ser preso e condenado. Avançada a história, sentimos que a alegria de conhecê-lo foi um sonho, mas sua pronta reaparição faz que a tristeza de perdê-lo também fique no passado.

As canções do norte-americano Stephen Schwartz - que do musical de teatro passaram ao filme Godspell, de 1973 - estão nesta versão gaúcha bem traduzidas à nossa linguagem, inclusive com o típico “tu”. Algumas liberdades foram necessárias para ajustar a mensagem ao público atual e assim retraduzir para nós o que os norte-americanos (de marca protestante) lêem na peça original.

Godspell (veja o filme completo aqui, 1h40 sem legendas) faz adicionalmente um louvor em imagens à cidade de Nova Iorque, com seus parques e impressionantes edifícios, incluídas as Torres Gêmeas recém construídas. A primeira foto acima, capa da trilha sonora, é de uma cena filmada no topo do antigo World Trade Center, na época o edifício mais alto do mundo, com mais de cem andares.

A mensagem turística focada em Nova Iorque é tão óbvia que as imagens se colocam ao nível do texto, como dizendo: "Cristãos do mundo, amem sua própria cidade". Os pelotenses verão, no clipe abaixo (Save the People), um chafariz parecido ao da Praça Osório e poderão até ver alguma semelhança entre o Rio Hudson e o canal São Gonçalo.

Com todas as mudanças e simplificações, permanecem em Day by day (a peça gaúcha) os conteúdos do Evangelho, tipicamente o amor comunitário, a fé incondicional em Deus e a renovação do mundo. Inclusive ficou conservada a mescla de estilos musicais mais comuns dos Estados Unidos (rock, ragtime, gospel, sapateado).

Uma só inovação pareceu-nos desnecessária, ainda que bem apreciada pelo público: a melodia Hosanna Hey, que pertence a “Jesus Cristo Superstar” (ópera-rock de 1970). Afinal, o próprio filme Godspell, feito em 1973, entre tantas citações, também punha no seu Jesus recém batizado o “S” de Superman, detalhe inerente à mentalidade ianque, mas alheio ao cristianismo (contraditório, inclusive).

Algumas alusões a nossa cidade contribuíram a aproximar do público a mensagem religiosa com humor e otimismo, sem as solenidades das catequeses tradicionais, mas conservando os “puxões de orelha” do discurso cristão. Por exemplo, o bom samaritano e o filho pródigo aparecem como personagens pelotenses. Na atualizada parábola do rico e do pobre (parodiando Lucas 16, 25), um engraçado Pai Abraão diz ao rico que reclama por sua condenação:

- Filho, então tu pensavas que a vida era como uma caixa de docinhos de Pelotas?

Banda e coro, presentes no palco, desempenharam-se com agilidade e entusiasmo, acompanhando com perfeita sintonia os atores-cantores, também estes com boa pronúncia e afinação. A voz mais expressiva é da Madalena, que canta Day by day e “Aonde vais?” com graça e sensibilidade. O Jesus, personagem tão idealizado, tem aqui muito boa expressão corporal, mas com maior serenidade pareceria mais um mestre que um discípulo. Leves problemas nos microfones dos atores dificultaram a audição de algumas falas. Além de um bom conceito e um bom texto, é sobre o trabalho deles que se apoia o sucesso deste espetáculo, apresentado somente numa temporada breve a cada ano.

O público, quase a metade do Teatro Guarani em cada apresentação, aplaudiu com entusiasmo e carinho o trabalho dos artistas visitantes, e estes retribuíram com uma repetição do trecho “A luz do mundo”, música baseada no Sermão da Montanha (de Mateus capítulo 5).

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