Em seu "Balaio de Causos" (Pallotti, 2010, p. 42-43), A. B. Silveira homenageia o amigo Lino de Jesus Soares, hoje com 80 e poucos anos, destacado professor e grande contador de histórias engraçadas. O livro saiu há uma semana (veja nota).
Nos anos 50, o então jovem arroio-grandino trabalhava em pequenos empregos para custear seus estudos. Mário Pianaldi, seu patrão na fábrica de papel Etri (zona do Porto), havia comprado um boi na Zona Norte e precisava levá-lo até a empresa, na Rua Benjamin Constant, e de lá a sua fazenda, atravessando o São Gonçalo pela balsa (na época ainda não havia ponte).
Nenhum empregado se atreveu a levar o animal a cabresto cruzando toda a cidade, uns 6 km. Lino soube da oferta e — como tinha experiência na lavoura, quando criança — enfrentou o inusual desafio, para conseguir os trocados.
Foi buscar o bicho (que provavelmente era um touro), colocou-lhe o buçal e empreendeu a caminhada: Avenida Argentina (hoje, Fernando Osório) até a Curva da Morte, Avenida Bento Gonçalves e a longa Quinze de Novembro.
A insólita dupla passou tranquilamente pelo coração da cidade, inclusive ante o Café Aquários (ou talvez fosse na fase em que tinha o nome de Café Nacional), onde tempo depois Lino trabalharia como garçom, ainda naquele admirável esforço de ganhar a vida humilde e honestamente.
A Rua Quinze tinha já mão única, mas o jovem professor ignorou as normas de trânsito e fez o trajeto na contramão, chamando assim a atenção dos pelotenses duplamente: não se viam animais de grande porte sendo levados a cabresto (as pedras do calçamento eram as mesmas de hoje) e muito menos na contramão.
Fui assim cumprida a grande missão e o pagamento ajudou a engordar o magro salário daquele tempo de vacas magras.
Foto: W. Sanders, 1946 (LIFE)
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