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segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Um pórtico polêmico

Foto de Carlos Queiroz sugere união entre a casa e sua "entrada".
Um pórtico é o espaço de entrada de uma grande construção (como um templo ou um palácio) que soleniza o conjunto e o ingresso a ele. É um elemento arquitetônico da Grécia Antiga que se disseminou pelas demais culturas.

Modernamente se aplica também a cidades; temos, por exemplo, o impressionante portão de Gramado, o pórtico com farol em Santa Vitória do Palmar, o pórtico de entrada a Rio Grande.

Ainda hoje Pelotas é uma das tantas cidades que não têm um pórtico especial que assinale a entrada a seu perímetro urbano.

Com sede própria há uma década, a Academia Pelotense de Letras sentia a falta de uma entrada digna. A antiga construção, que já foi escola, não conta com vestíbulo nem com cercas de proteção: quem chega de fora já entra ao salão, sem preâmbulos (veja nota com imagens da casa).

Presidente reeleita mais de uma vez nestes anos, a escritora Zênia de León propôs há uns cinco anos um pórtico grego para esta casa. O projeto foi questionado (notícia de julho passado) — e ainda é — mas obteve as licenças formais e foi inaugurado este sábado (10), sem que a polêmica diminua. Tem relação com o parque? Tem relação com a Academia? Tem relação com os 200 anos de Pelotas? Deveria ficar na entrada da cidade ou em outro logradouro público?

Prefeito e acadêmico Fetter Jr. inaugura o monumento.
O prefeito Fetter Júnior, que como escritor é também integrante da Academia, recebeu simbolicamente o pórtico como um monumento dedicado à tradição pelotense e o descreveu como um novo ponto turístico da cidade (notícia do Diário Popular, no mesmo sábado). Mais exato seria dizer que o ponto turístico é o parque Dom Antônio Zattera e este pórtico, um de seus tantos monumentos.

O portal da Prefeitura na internet também não esperou a segunda-feira e emitiu a notícia este domingo, com fotografias (veja a nota).

A estrutura superior contém o lema Per aspera ad astra (literalmente, "pelas asperezas às estrelas"), em letras análogas ao nome que está na fachada, "Academia Pelotense de Letras".

Crase com acento agudo usava-se até os anos 40.
Abaixo de cada par de colunas que sustenta essa estrutura, há uma placa:
  • a da esquerda diz "Á Tradição Cultural de Pelotas em seu Bicentenário" (com acento agudo no A), como se vê na foto (dir.);
  • no da direita se lê "Academia Pelotense de Letras, Zênia de León, 2012".
Alguns veem o pórtico como um monumento bonito e significativo, enquanto outros o consideram irrelevante e até sem sentido estético, histórico ou urbanístico — opiniões que eram emitidas e publicadas antes que fosse construído. Agora que a ideia saiu do papel e ocupa o espaço público, pode e deve ser avaliada pela população.

O novo apêndice arquitetônico tem a virtude de chamar a atenção visual e de suscitar discussão na comunidade, mas ainda uma quantidade de falhas entorpece os seus bem-intencionados objetivos:
  • o pórtico foi pensado para a sede da Academia, mas não serve de abrigo nem facilita a entrada ao visitante, deixando a casa com o mesmo problema estrutural,
  • os encontros que se realizavam na sombra das árvores passarão a ser feitos sob o rigor do sol,
  • a estrutura destaca muito mais a Academia como entidade (com inspiração na Grécia Antiga) do que a tradição da cidade (identificada com a Europa renascentista e ainda com elementos africanos), ambas fortemente ancoradas no passado,
  • o destaque à Academia fica ainda mais evidenciado pela "assinatura" da presidente como autora do pórtico (na placa da direita) e pelo uso do lema em latim (sem clara relação com Pelotas),
  • Pelotas tem vários prédios com colunas gregas, mas construí-las em 2012 é extemporâneo, e ainda mais em desacordo com o estilo da casa para o qual foi feito,
  • uma cidade com consciência turística poderia sim ter um pórtico de entrada, e o debate sobre sua construção, desenho e lema deveria ser feito por todos os segmentos sociais,
  • a gafe da crase com acento agudo (foto acima) não fala bem da função linguística da Academia; fica talvez como anacronismo, lembrando que era nesse formato (Á) que se escrevia há cem anos (veja notícia de 1912 no Correio do Povo).
Restará à comunidade pelotense incorporar este novo elemento em seus costumes e sua vida cultural, relacionando-se mais intensamente com esta associação literária que pretende conscientizar nosso passado e acompanhar-nos, mesmo com asperezas no caminho, às altas estrelas do futuro.

Monumento em forma de pórtico, dedicado à tradição cultural de Pelotas

POST DATA
3 fevereiro 2013

Em agosto de 2012, o arquiteto Pedro Marasco da Cunha emitiu uma opinião profissional sobre a localização do monumento, que ilustrei com imagens de outros pórticos na arquitetura pelotense (veja o post).


Após a publicação da presente nota, ainda no mês de novembro de 2012, a Academia fez a correção no acento do "A" que contrai preposição e artigo. 


Fotos: C. Queiroz (1), R. Marin (2-3), F. A. Vidal (4-6)

6 comentários:

  1. Pra quê tanto estardalhaço!
    Apenas um monumento num espaço publico!
    como tantos outros do rotary club, lions club, e por ai vai!
    e dizer que é de mal gosto, mas qual é o bom gosto, o teu?!
    cada um com seus gostos. sem essa de bom ou mal gosto!

    Obrigado pelo espaço.
    Gabriel DaMatta

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  2. Existem estudos arquitetônicos que poderiam ser feitos, não se trata apenas de bom gosto e sim de conhecimento.

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  3. Gabriel, o post tenta destacar que o "estardalhaço" é de quem criou o pórtico, e não se trata de "apenas mais um monumento". Ele foi pensado com detalhe e por anos, para durar muito tempo mais, e não pretende ser "como tantos outros". Quem fala de bom ou mau gosto tem seu direito, mas o post entregou razões a serem analisadas, e não uma simples rejeição.

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  4. Gostei da reportagem! Parabéns!
    O Pórtico é a cara do "escritor Fetter Júnior".
    Pobre Pelotas cidade turística e cultural..quanto tempo não se constrói um teatro, uma praça, cinema...o entorno da praça "coronel" Pedro Osório está detonado..o Teatro Sete de Abril é a cara do governo de Pelotas.
    O tal shopping popular é um monstro em cima de uma praça, puro concreto. Tudo que o governo pelotense faz (quando faz) é de qualquer jeito..
    Que tristeza esse troço e aquela casinha tão legal la na praçaser lugar de gente tão simplória
    Podia ser um centro de artes e ofícios funcionando todo os dias para quem quisesse fazer coisas!!
    Mas estamos em Pelotas...

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  5. Em menos de 24h, este post é o mais visitado do blog neste mês, duplicando o que está em segundo lugar ("Casarão e senzalas"). Os pelotenses se interessam por entender-se a si mesmos, observando suas próprias características.

    Esta casa da ex-escola e ex-sede de escoteiros estava em deplorável estado, quase em ruínas, e foi cedida à Academia, que com próprios fundos a recuperou. Melhor assim.

    O entorno da praça estava sucateado sim, há uns anos, mas se encontra todo em recuperação, é questão de ir ali e abrir os olhos. As exceções são o Sete de Abril, cuja verba já foi autorizada após 2 anos de verificações, o Clube Caixeiral em decadência, e a antiga Secretaria da Fazenda, prédio destinado à Câmara de Vereadores, que espera há décadas o financiamento para restauração e reforma.

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  6. Tenho muito orgulho do meu marido,á ele foi entregue a planta deste pórtico...Demorou mas Graças a Deus deu tudo certo...Parabéns Amor pela tua capacidade,e Parabéns á todos pelo projeto...Ficou Show!

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