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segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Cisne negro ou cisne branco

O 3º ciclo Filosofia e Cinema (v. nota) debateu, ao longo de 2012, sobre filmes com temática psicológica, especificamente as várias formas de loucura, algumas de origem social e manchando os psiquismos, e outras saindo das entranhas do indivíduo e atrapalhando a sociedade (v. lista dos 30 títulos).

Na penúltima sessão, sexta 30 de novembro, o público viu "Cisne Negro" (2010), dirigido pelo norte-americano Darren Aronofsky. Após a projeção, por mais 45 minutos o público discutiu sobre os significados do filme, com a condução da mesa: o coordenador do ciclo, Luís Rubira, e o psicanalista Jorge Velasco (última foto abaixo), que começou comentando as implicações psicológicas da história.

Nina é uma bailarina destacada, totalmente dominada pela mãe, e que se vê desafiada a desempenhar dois papéis contrapostos no balê de Tchaikovsky O Lago dos Cisnes: a branca Odette e a obscura Odile, transformadas em cisnes e competindo pelo amor do príncipe Siegfried.

A história do filme transcorre em narração paralela ao roteiro do balê clássico, com as meninas em conflito em torno ao diretor: conflitos internos da bailarina central (que imagina uma competidora) e conflitos entre as outras bailarinas, preferidas ou abandonadas pelo mesmo diretor.

A história também elabora o final trágico do balê: neste, os amantes morrem um por causa do outro (como em Romeu e Julieta, de Shakespeare) e no filme, a protagonista fracassa em sustentar a divisão interna para representar os dois papéis.

A falta de contato com a realidade e a dominação sofrida pela mãe narcisista fazem que Nina, despertada para o Cisne Negro dentro de si mesma, queira eliminar o lado branco (que considera perigoso e poderia ser um falso self, na terminologia de Winnicott). O desejo de eliminar o que é perigoso está na base dos comportamentos humanos mais primitivos e origina também os crimes passionais, o terrorismo e a repressão do Estado à delinquência.

A fantasia da personagem quer manter vivo o lado negro, que o diretor valorizou nela, pela eliminação do branco. No entanto, sua mentalidade dividida não permite a unificação nem a sobrevivência da dupla (falsidade-verdade, bondade-maldade, perfeição-espontaneidade). Talvez tardiamente possamos descobrir que um falso self não morre nunca; somente é utilizado por um "verdadeiro self" que vem a despertar e assumir a condução da personalidade, antes banalizada por aparências e conveniências.

A bailarina consegue representar em sua mente e em sua carne a contraposição entre os dois cisnes (o que ela entende como "perfeição" e realismo total). No entanto, podemos aprender a viver e superar esse conflito de modos mais abstratos e inteligentes, sem atuações tão viscerais e definitivas que nos levem a um beco sem saída. O filme não mostra como se faz isto, pois seu roteiro apontava somente à fragmentação da débil estrutura de Nina.

Em momentos de crises de crescimento, o homem duvida entre o agradar neurótico (o bem branco) e o desabafar psicótico (o mal negro). Cada um lhe dá graus e formas diferentes de prazer e lhe falam ao ouvido como um anjinho e um diabinho, como a Bela e a Fera. As duas vozes são contraditórias, mas se preservam uma à outra, não se eliminam. São tendências da mesma pessoa.

Professor de Psicanálise Jorge Velasco (de branco),
em integrado diálogo com prof. Luís Rubira (de negro)
A pessoa que quiser o equilíbrio deverá fazer as duas partes dialogarem e conviverem, sem fugir nem se atacarem. Quem não conseguir essa convivência, ficará no chamado estado esquizofrênico.

De forma parecida, a sociedade não elimina o mal dentro de si ao eliminar os perversos e psicopatas, pois sempre surgirão outros. A repressão em grau médio mantém o sistema neurótico (com tensões e doenças), mas o recrudescimento da violência social e do Estado agravam a divisão mental e fazem os mais fracos explodirem em surtos psicóticos.

Sobre o mesmo filme aqui comentado, veja uma leitura junguiana e um comentário da Soc. Paulista de Psicanálise.

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