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quarta-feira, 24 de abril de 2013

Perguntas que Neruda não fez

Aquele que vê o mar por primeira vez... 
o que está vendo realmente?

Como seria o mundo se a lua
irrompesse no lugar do sol?

Onde perdi parte de
mim que o poema achou?

O sol dissolve no chão favos de mel
para atrair a abelha rainha?

À noite sonhamos
ou brincamos de morrer?

A andorinha solitária que fez verão
tem ninho assegurado no outono?

Os pés não se cansam de andar
quando a vontade é de voar?

O que pode ser mais ingênuo
que sonhar de olhos abertos?


O que revela a raiz da árvore à terra que a protege?
Os caminhos que conduzem a Deus são os mesmos do arco-íris?
Por que sonhar grandes sonhos, e desprezar os pequenos que se realizam?
A chuva chora de tristeza ou quer apenas regar a terra?

Quantos pingos tem a chuva?
Haverá mais estrelas no céu?
A felicidade das nuvens será a mesma da chuva?
Por que os dias sombrios não roubam as cores do arco-íris?

O silêncio que se ouve na natureza é o som de Deus ao dormir?
É um condor que voa no azul do céu ou negra nuvem a sonhar?
A verdade sobreviverá se as mentiras morrerem?
Que lembrança terá a chuva da nuvem onde foi gerada?

Para quem brilham as estrelas quando brincamos de morrer?
O que mata mais: o tédio ou o canto da sereia?
O velho que dorme de olhos abertos é um menino soltando pipa?
Dentre todas as solidões a da alma doente é a mais nociva?

O amor do poeta pelos versos é o mesmo da flor pela brisa?
Há mais perguntas a serem feitas que respostas a serem dadas?
Que diálogo existirá entre a luz e a sombra?
No vácuo entre o silêncio e o som irrompe a semente da música?


Quanto dura um rinoceronte depois de ser enternecido?  (Livro das Perguntas)

Manoel Soares Magalhães homenageia Pablo Neruda (1904-1973) escrevendo um segundo Livro das Perguntas, seguindo o estilo do poeta chileno. O original em espanhol foi publicado postumamente, em 1974. 

O escritor e artista plástico pelotense vem publicando as perguntas no blogue Cultive Ler desde junho de 2012. Todas as desta postagem são de autoria dele, exceto as das imagens; a do mar (1ª imagem acima) é minha, autor deste post; a do rinoceronte e a da rosa (abaixo) são de Neruda. 

Os epigramas interrogativos são frases tão concisas que o leitor não chega a perceber se se trata de prosa ou verso. A brevidade e o sabor sonoro exigem uma leitura vagarosa e em voz alta, como o versículo final de um salmo. 


Veja no blogue de Soledad Cifuentes algumas perguntas de Neruda, traduzidas e desenhadas, e na página Libro de las Preguntas alguns trechos originais.

Imagens: Garatujas fantásticasRecreio e Eu e meu chapéu

7 comentários:

  1. Magnífica ideia! As perguntas que Neruda não fez são tão originais quanto as suas. Belo trabalho de Manoel, que, por certo, renderá outro livro. Dea

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  2. Caríssimo, obrigado pela valorização do meu trabalho. Abraços

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  3. Como se diz em Pelotas: "Merece!"

    A homenagem que o mestre Neruda recebe ao ser recuperada sua linguagem é que o poeta não é posto num pedestal divino mas sim sua proposta é revivida e reatualizada, em novos momentos e novos espíritos, ao modo de um discípulo que aprende de verdade a lição de vida.

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  4. Manoel, um dia pensei que os meus epigramas tinham algo. Mas agora, cotejando com os teus, vejo que os meus foram frios. Enfim: não sou poeta, como tu, para escrever coisas tão lindas e tocantes. Como faço para te ler mais na Internet? Parabéns. Um abraço, Rubens Amador.

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  5. Amigos, gratos pelas palavras. Ao cronista Rubens Amador, cujo talento às letras vem sendo mostrado ao longo do tempo, deixo aqui endereço virtual para encontrar meus textos, minhas ideias, meus sonhos, meus desejos...

    Grande abraço a ambos!!!

    https://www.facebook.com/pages/Manoel-Soares-Magalh%C3%A3es/318394951519283?fref=ts

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  6. Lindas imagens! Sou fã de Neruda e lendo os epigramas do poeta pelotense tenho impressão de que o Neruda está mais vivo do que nunca. Quanto frescor nestes textos! Maravilha. Adélia

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  7. Tenho o livro editado pela L&PM, que se encontra entre os de cabeceira. Que grande oportunidade encontrar alguém que constrói perguntas tão interessantes quanto as de Neruda. Manoel é um poeta e tanto.

    Leonel, Pedras Altas.

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