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quinta-feira, 23 de julho de 2009

Crônica de uma festa literária

A escritora pelotense Beatriz Mecking esteve na 7ª FLIP e fez um resumo, que condensei ainda mais para caber num único post. Ao iniciar este blogue, mencionei esta Festa Literária como um exemplo a ser seguido (veja o post).

É preciso imaginação, amor e ousadia para romper a inércia e estabelecer nexos com o resto do Brasil, especialmente na área cultural, onde Pelotas se considera autossuficiente. Aceitemos o convite de viajar nesse impulso. Parati é especialmente inspiradora por sua história de 440 anos e por sua geografia - situada entre dois rios, à beira do Atlântico e no limite fluminense-paulista.

Ao sul do Rio

De ônibus, Paraty está quase quatro horas ao sul do Rio de Janeiro. A cidade tem umas quatrocentas pousadas.

Ao chegar, almoço um peixe com camarões num quiosque da praia [acima], e a pouco mais de um quilômetro, entre morros e a mata exuberante, encontro o palco onde, durante cinco dias, se desenrolará a FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty, evento que se realiza anualmente na cidade desde 2003).

Toda a cidade vive em função da Festa

Em duas longas filas esperam: os que buscam os ingressos já comprados e os que tentam vaga para as atividades que ainda não lotaram. São 18 mesas de debate que se sucedem de quinta de manhã a domingo à tarde, no palco da Tenda dos Autores [dir.].

Na Casa da Cultura, há uma programação paralela, este ano dedicada às relações Brasil-França. Para as crianças, existe a Flipinha; para os adolescentes, a FLIPZona. Sem falar em atividades culturais que compõem a OFF Flip. Além de outras visitas e passeios turísticos.

Toda a comunidade parece envolvida, de alguma forma, no grande acontecimento. E dou-me conta de que, infelizmente, não vou poder atender a tudo.

Abertura da Festa

O início oficial foi dado pelo escritor Davi Arrigucci Jr., um dos mais conceituados críticos literários brasileiros.
O homenageado da FLIP 2009 foi Manuel Bandeira, cuja poesia Arrigucci já analisou em dois livros: "Humildade, paixão e morte" (1990) e "O cacto e as ruínas" (1997). Ele discorreu sobre o alumbramento de Bandeira - um sentimento poético baseado no desvendar da rua, das coisas humildes, vivido por ele no bairro da Lapa, no Rio.

Após a conferência de abertura, Adriana Calcanhotto apresentou-se na vizinha Tenda do Telão, espaço em que muitos assistiam às mesas, já que não era fácil conseguir um lugar na Tenda dos Autores. Para ir de uma tenda a outra, usa-se a romântica pontezinha [esq.] que teve movimento ininterrupto durante os dias da FLIP.

Alguns destaques da FLIP

Nos dias seguintes, frequentamos as mesas e uma avalanche de debates e depoimentos que, de maneira geral, se mostraram enriquecedores. Autores de nove países versaram sobre os mais diferentes temas, apresentaram trechos de suas obras, trocaram experiências, interagiram com a platéia.

Ma Jian e Xinran, chineses exilados na Inglaterra, estiveram na mesa de debate "A China no Divã". Mas preferi ir a uma palestra com o francês David Foenkinos e, para me penitenciar da falta, comprei "Les funérailles célestes", da escritora Xinran, sobre as relações da China com o então soberano Tibete.

Em conversa com Silio Boccanera, o biólogo britânico Richard Dawkins, autor de "Deus, um delírio", revelou-se um darwinista convicto; embora não darwinista social, Dawkins é tido como o principal evolucionista em atividade.

Chico Buarque [dir.] e Milton Hatoum, na concorrida mesa intitulada "Sequências brasileiras", cotejaram seus últimos livros (respectivamente: "Leite derramado" e "Órfãos do Eldorado"), em que mostram visões críticas do Brasil.

O português Antonio Lobo Antunes esteve à frente da mesa "Escrever é preciso", com sua presença forte, suas respostas inteligentes e por vezes irônicas. Neto de brasileiro, afirmou ter começado a amar a literatura através dos versos de nossos poetas.

As francesas Sophie Calle e Catherine Millet se inserem na autoficção, vertente que mescla a vida privada e a vida literária.

Esses são alguns destaques de um encontro que nos fez conhecer nomes de estatura e relevância mundial.

Gostaria também de mencionar o cálido poeta Eucanaã Ferraz e a poetisa pelotense Angélica Freitas, que lindamente evocaram Bandeira [veja a no blogue da FLIP].

Retorno a Pelotas

No domingo à tarde (5 de julho), deixei já com saudade o ambiente tranquilo de Paraty, suas ruas de pedras, seu belo casario colonial, aquele centro histórico onde me havia sentido bem acolhida.

Na lembrança, levava o exemplo que poderia ser imitado por outras comunidades (e já várias cidades estão montando eventos do gênero). Com dedicação, paulatinamente, é possível chegar lá, organizando uma programação que divulgue valores, que os traga para junto das pessoas, que intercambie cultura. Que seja suficientemente instigante.
Fotos de Beatriz Mecking (1-3, 5-6) e FLIP (4)

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