Apesar do elemento óbvio (carnaval em Pelotas), a matéria foi oportuna, pois esse bloco se reúne uma só vez por ano, não entra na programação oficial, fica longe das passarelas urbanas e marca uma distância, também no tempo, dos carnavais populares e multitudinários de nossa cidade.
O original dessa informação é que um veículo oficial estivesse noticiando sobre baixos costumes do povo (em vez de divulgar os serviços municipais) e, ainda mais, fora do horário normal de trabalho. Ousadias atribuíveis à irreverência dos tempos de Momo.
Sem chegar a ser um verdadeiro bloco, as Sereias da Lagoa têm a missão de seguir a tradição carnavalesca dos homens vestidos de mulher. O costume sempre foi mais forte em Pelotas que em outras cidades do sul do Brasil, e começou a decair na década de 1980, até restar este único foco de conservação (nascido na praia do Laranjal na década de 1990).
Este travestismo carnavalesco não equivale a um desfile gay nem a uma amostragem de drag queens, mas a uma antiga sátira que os homens fazem ao lado feminino (tanto de mulheres como de homens) e da sua própria masculinidade.
A julgar pela evolução dos carnavais, a brincadeira pública provavelmente surgiu no início do século XX ou fins do XIX, ou seja, em tempos vitorianos e tridentinos, bem moralistas e solenes. Hoje, a sátira ao homossexualismo é politicamente incorreta.
A espontaneidade semiclandestina deste grupo burlesco pelotense dificulta obter boas imagens do seu desfile, tanto pelo horário como pelo lugar. Após concentração no centro comercial Mar de Dentro, as Sereias têm o costume fixo (sutilíssima alusão ao horário de trabalho, na prostituição) de sair no sábado de carnaval ao entardecer, somente na praia, mas também brinca com o fator surpresa e com as emoções secretas do exibicionismo (veja uma nota pobre em texto e pobre em imagem, sobre este bloco no carnaval de 2011).
Em 2010, o jornalista Miguel Martins redigiu uma nota para o blogue Satolep na Rede, com excelentes imagens de Cláudia Pureza Duarte. Entre os foliões, a fotógrafa captou o músico Sady Homrich, de branco na foto acima à esquerda. Leia sua confissão de amor pelo Laranjal (e por sua mulher) na Zero Hora de 1-2-12.
A maioria dos participantes - se não a totalidade - são homens masculinos e heterossexuais. Somente no carnaval eles ousam desfilar como algo que nunca foram nem serão, arremedando os traços mais histéricos do sexo oposto, com as melhores ou piores roupas de suas irmãs e namoradas. A intenção não é, portanto, a de tirar do armário lados ocultos e assumi-los seriamente. No vídeo abaixo, de 2008, uma gravação fora do desfile, que mostra bem o espírito da coisa.
Fotos: G. Xavier (1), C. P. D. Boéssio (2-3)
POST DATA
8-2-13
Há um ano, Sereias da Lagoa abriu página no Facebook. A saída de 2013 está anunciada para este sábado (9).
O acontecimento promete ser marcante, numa cidade que não quis suspender o carnaval após a tragédia em Santa Maria, mas mesmo assim não terá bailes nos clubes (interditados por medidas de segurança) nem escolas de samba na data nacional (a organização adiou os desfiles para os últimos fins de semana de fevereiro).
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