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segunda-feira, 18 de março de 2013

A voz do corvo: "Nunca mais".

Aves de mau agouro há  em todo o mundo,
e falam em todos os idiomas.
A artista plástica e professora da UFPel Adriane Hernandez participou, em outubro de 2009, da primeira exposição na antiga Cotada, a "Arte no Porto III", organizada por José Luiz de Pellegrin.

Talvez ao observar o prédio num estado de abandono de décadas ocorreu-lhe a expressão "nunca mais", do poema-relato "O Corvo" (The Raven), de Edgar Allan Poe (veja tradução de Fernando Pessoa).

Adriane não podia trazer aves falantes nem longos textos, mas atualizou em nossa realidade a frase agoureira, que em si mesma sintetiza muitos significados, e serve de resposta em espelho a muitas perguntas e desejos humanos.

Junto ao poder de síntese e ao realismo interativo do objeto em exposição, a artista tocou num dos temores de fracasso mais íntimos do ser humano, o da solidão perpétua. No momento e lugar menos pensado, um bolinho da sorte pode dizer-nos que será realizado nosso maior medo.

A temida frase do corvo é vivida cada dia,
 pelas almas depressivas.
Adriane jogou também com o elemento surpresa, essencial na literatura e valorizada pelas artes visuais que incluem a interação com o espectador. Acrescentou a isso a conexão auditiva com a frase do poema, ressignificando um conteúdo trágico como tragicômico.

Uma boa tese literária poderia relacionar a vida e a obra de dois poetas depressivos e mal-sucedidos: o americano Poe (1809-1849) e o nosso Lobo da Costa (1853-1888), falecidos de modo triste e prematuro. O paralelo foi proposto por Mozart Victor Russomano no discurso "O drama de Lobo da Costa", para o centenário do poeta (1953).

O material usado no trabalho de Adriane Hernandez foi um dispensador de senhas com pé de apoio, desses que davam número para espera em filas de bancos e lojas bem organizadas. Em vez de senhas numéricas, que deixavam a esperança de ser atendido em certo tempo, aqui lemos a resposta padrão, fria e definitiva: "Nunca mais".
Fotos: F. A. Vidal

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