Este sábado (20-7) às 20h, a Sociedade Científica Sigmund Freud e a família Madrid Francisco receberão amigos para inaugurar a quarta exposição póstuma de Chico Madrid, fotógrafo jornalístico que partiu em 2009 aos 28 anos (v. o post Fotos de Chico Madrid). A pedido da família, três de seus amigos fotógrafos fizeram uma seleção de negativos a partir de seu acervo de fotos em preto e branco, inclusive da era pré-digital, e daí nasceu esta mostra.
A exposição segue até 3 de setembro em horário comercial no Espaço de Arte Chico Madrid (Princesa Isabel 280, conjunto 302), com curadoria de Eduardo Devens. O relato a seguir é o discurso de apresentação da mostra, escrito por Anna, irmã de Frederico Madrid Francisco, o Chico Madrid.
FOTOS QUE NOS LEMBRAM CHICO
Após a morte do Frederico, há quatro anos, seus familiares encontraram, entre os pertences dele, muito material fotográfico: papel para ampliação, produtos químicos para revelação, muitos rolos de negativos, pinças para manipulação de negativos, um amplificador tcheco, livros sobre fotografias e coletâneas de fotógrafos famosos, etc. Este material fora comprado, no país e no exterior, por seus familiares, a pedido do Fred. Ele usou parte deste material e deixou outra parte sem usá-lo, ao falecer.
Em vida, era freqüente que Fred improvisasse um laboratório fotográfico, no quarto de seu irmão mais velho, Bruno, que já não mais residia em casa. Vedava todas as frestas, para não entrar luz; cobria uma lanterna com um plástico vermelho, para não velar os filmes e as cópias. Assim, revelou muitas fotos em preto e branco. Fazia isto madrugada adentro. Dia seguinte mostrava garboso seu trabalho, sua obra de arte, para nós. Em certo momento chegou a pensar, junto com seu pai, em construir, anexo à casa, um espaço próprio para esta atividade.
Para fazer suas fotos em negativo, Fred usava uma Olimpus OM 1, que deixou de ser de seu pai, assim que Fred nela lançou mão. Pai e filho ficaram muito contentes, quando Fred expressou o desejo de ficar com a máquina fotográfica de seu pai. Outra alegria inesquecível foi quando Fred recebeu, por correio, uma Rolleiflex 2.8 F, que seu avô trouxera da Inglaterra, onde havia morado, nos anos sessenta. Vô Jorge era muito cuidadoso e a Rolleiflex estava na caixa original, com muito pouco uso. Quando o avô soube que seu neto dedicava-se à fotografia, tratou de lhe fazer esta surpresa, enviando a máquina de Curitiba. Fred mostrava este “troféu” para seus amigos fotógrafos, comemorando a raridade e o estado da máquina, bem como por ser um presente de seu avô.
Quando seus familiares puderam, pois morte não permite isto de início, pensaram e resolveram oferecer este material fotográfico a quem pudesse usá-lo. Era como uma doação de órgão!
Imediatamente seus colegas e amigos do Diário Popular foram lembrados. Só que eles também precisaram de um tempo para vir até nossa casa para ver este material, certamente porque não era fácil para eles esta situação. Depois de muitas conversas, Carlos Queiroz, Moysés Vasconcelos e Paulo Rossi – respectivamente Carlinhos, Moitinha e Alemão, como Fred carinhosamente os chamava – combinaram que viriam olhar os negativos de fotos que Fred havia feito e dali retirariam um material para a atual exposição. Para tanto selecionaram os negativos que estivessem em condições de serem escaneados. Mas não era fácil encontrar um escaner para negativos daquele tempo. Se não fosse o hábito de guardar máquinas antigas, de outro fotógrafo amigo do Fred, talvez não fosse possível apresentar hoje as fotos desta exposição. Foi graças a Paulo Post, amigo de muitas horas e de viagens, que agora podemos ver ampliadas as FOTOS QUE LEMBRAM CHICO, em preto e branco.
No que me diz respeito, eu Anna, era a caçula da família, quando Fred nasceu. Meu irmão causou-me um duplo golpe: perdi o lugar de caçula e perdi metade da minha mãe que teve de dividir-se entre nós dois, pois eu tinha apenas um ano e quatro meses de idade. Na minha idade, ele foi persona non grata, pra começar. Mas Fred era também muito calmo, carinhoso e mimoso, tornando-se facilmente um boneco vivo para as fantasias de uma menina sentir-se também mãe dele.
Em vida, era freqüente que Fred improvisasse um laboratório fotográfico, no quarto de seu irmão mais velho, Bruno, que já não mais residia em casa. Vedava todas as frestas, para não entrar luz; cobria uma lanterna com um plástico vermelho, para não velar os filmes e as cópias. Assim, revelou muitas fotos em preto e branco. Fazia isto madrugada adentro. Dia seguinte mostrava garboso seu trabalho, sua obra de arte, para nós. Em certo momento chegou a pensar, junto com seu pai, em construir, anexo à casa, um espaço próprio para esta atividade.
Para fazer suas fotos em negativo, Fred usava uma Olimpus OM 1, que deixou de ser de seu pai, assim que Fred nela lançou mão. Pai e filho ficaram muito contentes, quando Fred expressou o desejo de ficar com a máquina fotográfica de seu pai. Outra alegria inesquecível foi quando Fred recebeu, por correio, uma Rolleiflex 2.8 F, que seu avô trouxera da Inglaterra, onde havia morado, nos anos sessenta. Vô Jorge era muito cuidadoso e a Rolleiflex estava na caixa original, com muito pouco uso. Quando o avô soube que seu neto dedicava-se à fotografia, tratou de lhe fazer esta surpresa, enviando a máquina de Curitiba. Fred mostrava este “troféu” para seus amigos fotógrafos, comemorando a raridade e o estado da máquina, bem como por ser um presente de seu avô.
Quando seus familiares puderam, pois morte não permite isto de início, pensaram e resolveram oferecer este material fotográfico a quem pudesse usá-lo. Era como uma doação de órgão!
Imediatamente seus colegas e amigos do Diário Popular foram lembrados. Só que eles também precisaram de um tempo para vir até nossa casa para ver este material, certamente porque não era fácil para eles esta situação. Depois de muitas conversas, Carlos Queiroz, Moysés Vasconcelos e Paulo Rossi – respectivamente Carlinhos, Moitinha e Alemão, como Fred carinhosamente os chamava – combinaram que viriam olhar os negativos de fotos que Fred havia feito e dali retirariam um material para a atual exposição. Para tanto selecionaram os negativos que estivessem em condições de serem escaneados. Mas não era fácil encontrar um escaner para negativos daquele tempo. Se não fosse o hábito de guardar máquinas antigas, de outro fotógrafo amigo do Fred, talvez não fosse possível apresentar hoje as fotos desta exposição. Foi graças a Paulo Post, amigo de muitas horas e de viagens, que agora podemos ver ampliadas as FOTOS QUE LEMBRAM CHICO, em preto e branco.
No que me diz respeito, eu Anna, era a caçula da família, quando Fred nasceu. Meu irmão causou-me um duplo golpe: perdi o lugar de caçula e perdi metade da minha mãe que teve de dividir-se entre nós dois, pois eu tinha apenas um ano e quatro meses de idade. Na minha idade, ele foi persona non grata, pra começar. Mas Fred era também muito calmo, carinhoso e mimoso, tornando-se facilmente um boneco vivo para as fantasias de uma menina sentir-se também mãe dele.
Existe uma canção da época da juventude de meus pais que diz o seguinte:
À l’ombre de nous restera toujours
au noms de l’amour un goût d’éternité.
Au noms de notre amour
Une ombre va rester.
au noms de l’amour un goût d’éternité.
Au noms de notre amour
Une ombre va rester.
Em tradução livre seria mais ou menos assim:
Na sombra de nós, ficará para sempre, em nome do amor, um gosto de eternidade.
Em nome de nosso amor, uma sombra vai ficar.
Nas muitas vezes em que revejo as fotos deixadas pelo Fred, imagino-as como recados dele sobre sua forma de ver o mundo e as pessoas. Suas fotos representam imagens da sombra de sua existência e da relação que um dia vivemos com ele. As fotos do Fred são sombras dele para nós. Nesta noite podemos ter o Fred através destas sombras. Em nome de nosso amor, estas sombras vão ficar.
Muito obrigada!
Anna Anderson Madrid Francisco
Pelotas, 20 de julho de 2013
"À l'ombre de nous", música do filme "Um homem e uma mulher" (1966),
cantada por Pierre Barouh, que representou o esposo falecido de Anne (Anouk Aimée)
cantada por Pierre Barouh, que representou o esposo falecido de Anne (Anouk Aimée)
Imagens: Espaço Chico Madrid
Uma foto registrada com sensibilidade é como uma poesia: mostra uma das faces da vida em todo o seu esplendor, ou tristeza, ou naturalidade.
ResponderExcluirParabéns pela idéia de lebrar aos leitores do blog um dos muitíssimos talentos que permeiam nossa sociedade. Belíssima foto e contundente poema. Gostei demais! Espero que muitos assistam mais essa página exemplar que premia quem tem acesso à internet.
Prof.ª Loiva Hartmann