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domingo, 18 de outubro de 2015

Um monumento para Mozart Russomano

Empossada na Academia Pelotense de Letras em dezembro de 2013, a professora Loiva Hartmann constatou que seu presidente honorário e patrono da cadeira 34, falecido em 2010, não tinha um monumento em sua cidade natal. Propôs à Câmara Municipal a construção de uma estátua (v. notícia oficial) e o projeto foi aprovado em forma de lei. Mozart Victor Russomano nasceu em Pelotas em 5 de julho de 11922 e deixou-nos em 17 de outubro de 2010 (v. artigo de George T. Georgis O Ministro Mozart e a crônica de Rubens Amador Vi o Dr. Mozart bravo!).

Hoje, cinco anos após a morte do ilustre juiz (v. reportagem do Diário Popular Cinco anos sem Mozart Russomano), o projeto está ainda em fase de realização. Em outras partes do Brasil, houve homenagens em 2012 e 2014. A própria acadêmica relata o fundamento de seu projeto no artigo abaixo, publicado no Diário da Manhã impresso (sábado 17-10-15). 

A professora e poetisa é Conselheira do Instituto João Simões Lopes Neto, Sócia fundadora do Museu do Charque e da Biblioteca Negra de Pelotas, Mentora da Jornada Cultural de Pelotas, integrante da União Brasileira de Escritores e Patrona do blogue "Pelotas, Capital Cultural".


Da Criação ao Juízo Final
As pessoas não morrem; permanecem encantadas em suas obras e no coração de quem as ama e admira. –  João Guimarães Rosa.
A mão direita do homem criador avança ao futuro.
O Patrono da Cadeira 34 da Academia Pelotense de Letras, Mozart Victor Russomano, permanece entre nós, mercê de sua personalidade, talento jurídico e capacidade de – sem extravagâncias ou exposição de seus cargos e diplomações – promover sua comunidade com um savoir faire inigualável.

Filho de Victor Russomano e Elda Costa Russomano, formou família ao lado da Professora Gilda Maciel Russomano, com quem pôde confirmar a predição do poeta Friedrich Von Schlegel (1772-1829): “Apenas em torno de uma mulher que ama pode formar-se uma família”. Seu filho Victor Russomano Júnior e Mozart Victor Russomano Neto transitam entre os tribunais das Turmas e Seções do TST, atestando a estirpe primorosa de que provêm.

Jovem, 1944, alcançou o cargo de Juiz do Trabalho. Fundador da 1ª Vara Trabalhista em Pelotas. Ministro em 1969, Corregedor-Geral da Justiça do Trabalho em 1975. Presidente fundador do Tribunal Administrativo da Organização dos Estados Americanos (OEA), de 1971 a 1976. Juiz Administrativo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), de 1981 a 1986.

Catedrático de Direito Trabalhista da UFPel. Presidente de Honra da Academia Ibero-Americana de Direito do Trabalho e Seguridade Social e do Instituto Latino-Americano de Direito do Trabalho e da Seguridade Social. Representante do Brasil na Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 1984 a 1990, sendo Presidente do Conselho Administrativo (o segundo brasileiro na história), entre 1997 e 1998. Doutor Honoris Causa e Professor Honorário em mais de 15 universidades nacionais e internacionais.

A destra humana aponta ao Criador de Tudo.
Autor de 45 livros jurídicos, muitos dos quais vertidos para outras línguas, além de artigos em revistas especializadas, capítulos em co-participação nas mais importantes obras em sua especialidade, o Direito do Trabalho, Processual e Previdenciário, e mais 15 obras literárias (v. bibliografia completa).

A atuação de Mozart na área cultural impressiona. Em 1960, a primeira Feira do Livro em Pelotas, de 25 de novembro a 4 de dezembro, contou com a colaboração do Instituto de Sociologia e Política da URGS, então sob a presidência do Dr. Mozart Victor Russomano. Ali se originou a Feira! O primeiro Orador da Feira do Livro foi o Dr. Mozart, dando continuidade ao cultivo das letras e artes na Zona Sul, especialmente em Pelotas, sua cidade. Em 1997, na Praça Cel. Pedro Osório, foi Patrono da Feira do Livro.

E nesse mundo mágico da criação literária, seus artigos e crônicas se destacam. Como professora de línguas e literatura, admirei sempre a propriedade e a sobriedade, temperadas por finíssima ironia machadiana, veículos do pensamento de Russomano. Usando linguagem culta, economizava adjetivos, dispensava termos rebuscados que dificultariam o entendimento às pessoas mais simples.

De fino trato, tinha especial consideração com seus admiradores e leitores de todas as classes sociais. O gentleman, o homem culto, o Ministro, sabia que na simplicidade está a sofisticação e o verdadeiro requinte! Poeta, contista, jurista, cidadão do mundo. Timbrava sua postura, polida pela vivência com grandes personalidades mundiais.

Tínhamos um encantamento, uma convicção comum. A civilização ocidental cooptou dos gregos o modelo. Nessa civilização, um poeta, Homero, no século lV já era um clássico. As artes são um exemplo da grandeza que os seres humanos podem alcançar. E há um artista que engloba todos os talentos: Michelangelo Buonarrotti. Em crônica iluminada, de 2003, Russomano detalhou como essa figura ímpar cobriu a Capela Sistina: “Bem no centro, a Criação do homem. Desce do céu, envolta em mistério e poder, a mão criadora, para tocar de leve o homem criado”. Ilustrei uma poesia justamente com a figura da Criação, pois estou convicta de que toda criação é um ato de amor.

Como mostra Michelangelo, "A Criação de Adão" é feita pela destra de Deus.
De 2002 a 2010, houve a Jornada Cultural de Pelotas. À semelhança de Paraty e Passo Fundo, teve como objetivo difundir as artes e a cultura. Em 2006, Dr. Russomano, a nosso convite, tentaria participar da 4ª Jornada. Havia feito grave cirurgia no quadril e recém iniciava a fisioterapia. Conscientes de que deveríamos nos conter, em respeito à sua idade e sofrimento, mesmo assim o lembramos da imensa motivação que sua presença provocaria aos assistentes. Por telefone confirmou que iria. A emoção foi indescritível!

No Pavilhão 2, Fenadoce, chegam os palestrantes: Ir. Elvo Clemente, Hilda Simões Lopes, Lígia Antunes, Mário Osório Magalhães, Luiz Antônio de Assis Brasil , Prefeito Fetter Júnior. Minutos depois, adentra ao recinto Dr. Mozart Victor Russomano, acompanhado de familiares, enfermeiro e seu médico. Quase impossibilitado de andar, fazia um esforço sobrehumano para estar com sua comunidade e mais: dar o exemplo de que, quando se quer realmente alguma coisa, não há o que nos impeça de realizá-la! Obrigada, caro amigo, pelo exemplo ímpar de determinação dado à nossa juventude, professores, cidadãos.
  • Em abril de 2012, o Tribunal Superior do Trabalho inaugurou o Auditório Ministro Mozart Victor Russomano, situado no 5º andar do edifício sede, em Brasília (v. notícia de 18-4-12 com o discurso do Ministro João Oreste Dalazen).
  • Em janeiro de 2014, o TRT da 11ª Região, inaugurando suas instalações no Foro Trabalhista de Manaus, deu oficialmente o nome de Mozart Victor Russomano a seu novo edifício (v. Resolução Administrativa 108/2013 do TRT11). A placa foi descerrada pelo desembargador David Mello Jr. e por Victor Russomano Jr. (foto abaixo).
Duas homenagens a um grande homem, o qual partilhou a largueza de seu espírito, a profundidade de sua sabedoria e a diligente força de seu trabalho com a Justiça Social do Brasil.

Os tribunais do trabalho de Manaus funcionam no Forum Ministro Mozart Victor Russomano.
Presidente de Honra da Academia Pelotense de Letras, leitor de Eça de Queiroz, assim o definiu: “Imortalizado no mármore de Teixeira Lopes, sustentando nos braços a nudez forte da verdade, levemente coberta pelo manto diáfano da fantasia, chamado constantemente pela evocação da saudade de seus leitores e pela voz do seu gênio, magicamente ele sai do mármore. Para onde vai? Vai ao encontro do mundo, nimbado pela admiração daqueles que amam a beleza, a arte, a realidade e a fantasia que dá cintilações à realidade. A realidade que inspira o artista, fazendo-o subir, voar nos espaços imensos e claros da imaginação e da glória!” ("O Poeta Anônimo", p. 65-66).

No séc. XIX, o escritor italiano Cesare Cantù (1804-1895) disse: “Querem conhecer o grau de civilização de um povo? Reparem naqueles que erguem monumentos!”. Hoje, cabe a todos nós eternizarmos em mármore e bronze a memória do eminente conterrâneo Mozart Victor Russomano. O jurista, o escritor, o poeta, o cidadão do mundo, o amigo, o pelotense ilustre. Para que os pósteros o conheçam e para que nós o tenhamos sempre presente.

Nosso projeto, proposto na Câmara Municipal e aprovado há um ano, é agora a Lei nº 6.151/ 07.08.2014. Autoriza o Município a edificar monumento a Mozart Victor Russomano na Praça Coronel Pedro Osório ou seu entorno. Ao conhecer o projeto, o prefeito Eduardo Leite disse: “Eu julgo absolutamente meritória esta iniciativa e assim que chegar até nós começaremos a viabilizar o ponto de vista jurídico e financeiro”.
Loiva Hartmann
Cadeira 34 da Academia Pelotense de Letras
Patrono: Mozart Victor Russomano
Projeto ideado por Loiva Hartmann para seu patrono na Academia de Letras
foi levado à Câmara e ao Prefeito, e transformou-se em lei em 2014.
Imagens: 13Horas (1), L. Hartmann (2), Vita Naturalis (3), Flickr (4) ASCOM (5)

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