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sábado, 24 de julho de 2010

A cidade coisificada no espelho

Victor autografa participação no livro
"Blog Amigos de Pelotas" (7-11-09)
Em 19 de outubro de 2009, aniversário de Glória Menezes, Victor Schroeder (esq.) escreveu no Amigos de Pelotas o artigo abaixo (leia o post completo; grifos meus). 

O jovem geógrafo sugere que o pelotense vê sua cidade... sem enxergar-se a si mesmo dentro dela. Uma crítica certeira e até dolorosa, que os leitores não pareceram entender na essência.

Fica a ideia positiva: uma cidade são as pessoas que a habitam, suas vivências e suas criações. Os prédios ficam iguais; nós é que fazemos a história, com nossas mudanças. Se Glória cresceu e brilhou fora, então não é parte de Pelotas. O melhor de uma cidade somos nós, alegres ou tristes, repetidores ou artistas, modernizadores ou saudosistas.

A história da cidade como fetiche
Glória Menezes visita Charqueada São João
Enfim, Glória Menezes voltou à cidade de sua infância. Ou não. A sua tristeza em ver que as casas continuam lá, mas o encanto e a simbologia se foram. Uma boa lição para quem pensa que reformar prédios é trazer de volta toda a glória (com ou sem trocadilhos, à vontade) para Pelotas.

É preciso ter em mente que muito do que se vende como “preservação da história, das tradições” não é mais do que um produto. Pelo simples fato de que a história é humana, feita de momentos, sentimentos; mesmo os prédios possuem uma alma dada por aqueles que o habitam.

Os casarões antigos nunca simbolizarão o que fomos, pois quem foi na verdade foram aqueles que viveram naquela época. São preservados – e precisam ser – como memória importante, embora incompleta, do passado, de um momento somente possível naquele instante. [...]

É de impressionar a “descoberta arqueológica” feita no Mercado Público, do início do século XX [ladrilhos hidráulicos da reforma anterior]. Não são os originais, já que o primeiro Mercado Público, lá do século XIX, foi destruído.

Se o amigo leitor foi aluno do Colégio Gonzaga, como eu, olhe bem para os ladrilhos e faça força. Sim, aqueles ladrilhos com desenhos de cubos, fazendo uma espécie de ilusão ótica, são os mesmos que eu e você ficávamos olhando durante as aulas de Religião. E eles continuam lá no Gonzaga.

Glória Menezes também é do início do século XX. Daqui a pouco será tombada também.

Soprano Luísa Kurtz e sua mãe, Sílvia
Faríamos melhor em Pelotas se, para além das homenagens com nomes de sala, formássemos novos atores. Se, para além dos tombamentos, construíssemos novas praças, novas escolas, dando a elas nomes de visionários de hoje – novos Pedro Osório, novos Joaquim Oliveira. Se, para além de tentar recuperar velhos dias de glória, buscássemos a qualidade de vida agora.

Sorrisos de criança,
amores de namorados,
cheiro de café fresco,
tarde ensolarada com um mate:
o que realmente faz Pelotas, não se tomba.

Victor Schroeder

Extratos de comentários ao post

Leitor 1 Desde que cheguei a Pelotas procuro entender por que o jovem tem horror às homenagens. Gasta-se muita energia homenageando o velho; por que o pelotense não tem condições de escolher seu futuro e dizer para os que lhe sugam as energias: "não mais"!!

Leitor 2 O progresso não passa nem pela negação autofágica do passado nem pela sua mitificação. Mas também não passa pela glorificação messiânica do futuro. Mas de novo o patrimônio histórico sempre será eleito como bode expiatório. De fato, as casas têm alma e para muitos a fúria iconoclasta se justifica porque já não se pode voltar ao passado e punir os charqueadores (pelo jeito os eternos vilões). Vamos deixar ruir a cidade e as casas "assombradas" por estas almas penadas de nossa história vergonhosa, a fim de exorcizar seus fantasmas e assim, livres, caminharemos rumo ao futuro nos braços do progresso.

Leitor 3 Victor: Concordo plenamente contigo quando falas sobre valorizar o presente e tentar fazer AGORA o futuro, mas não culpe a preservação da história por isso. Sorte a nossa que pelo menos o passado é valorizado, há bem pouco tempo nem ele era.

Victor Obviamente não sou contra a preservação do patrimônio. A mensagem é que ações podem ser melhores homenagens aos pelotenses do passado do que APENAS preservar casarões.

Fotos: F. A. Vidal (1; 4), Nauro Jr. (2), Cadernos do Cetres (3)

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