segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Os limites do impossível, contos gardelianos

Após duas aberturas de exposições, formou-se o triângulo da Noite Branca e o caudal de criatividade desembocou no Instituto João Simões Lopes Neto: uma terceira amostra artística, a apresentação do livro de Aldyr Garcia Schlee, música ao vivo (com José Luís Marasco Cavalheiro Leite), outro coquetel, e uma sessão de cinema tipo "madrugadão", com um curta e um longa-metragem. A maratona cultural durou sete horas.

Schlee começou a autografar minutos antes das 21h e não parou até 00h40min do outro dia. Não mostrou cansaço; ao contrário, parecia cada vez mais leve e contente. Escreveu uma centena de dedicatórias, cada uma delas pensada com manifesto carinho para seu destinatário.
"Os limites do impossível" são doze relatos que transcorrem no Uruguai de 1884. Cada conto se refere a uma mulher que teria contribuído ao nascimento de Carlos Gardel na cidade de Tacuarembó, por incesto violento.
O cantor se nacionalizou argentino em 1920 e não havia registro algum de seu nascimento, mas na Argentina se criou a hipótese de ele ter vindo da França (leia sobre a controvérsia).
Schlee começa o livro no momento da violenta morte de Gardel. O ídolo da música não podia morrer na plenitude da vida (perto dos 50 anos de idade, como outro ídolo nos EUA, em 2009). O sentimento dos fãs devia ser: "Não é possível, isto não pode estar acontecendo". O gênio, carbonizado! Entre seus restos mortais foram encontradas umas moedas e o passaporte chamuscado, onde ainda se lia "nacido en Tacuarembó, Uruguay". Até aí o relato de apresentação do livro.
Em vida, Gardel somente dissera sobre sua origem: Nací en Buenos Aires, a los dos años y medio. Se ele pudesse falar, suas últimas palavras em Medellín teriam sido sobre seu nascimento... inesperado, indesejado, errado, violento, horroroso, impossível. Dado esse final trágico, a única origem verossímil e concordante teria sido aquela que se negou sempre.

Com esses dois impossíveis, Schlee contrói fantasias possíveis, dentro de limites até bem reais, respeitando que toda ficção seria bem mais acanhada que a realidade que não se pôde falar. Aquela que com horror gritou ao mundo inteiro o que 50 anos antes teve que ser negado.
O livro é da editora porto-alegrense ARdo TEmpo, do artista plástico Alfredo Aquino. Houve um pré-lançamento na Feira do Livro de lá, na terça 10 de novembro (duas semanas antes de Schlee completar 75 anos).

Em Pelotas, o Instituto Simões Lopes Neto ficou lotado de artistas, historiadores, jornalistas e líderes culturais neste sábado (5), uma semana antes de mais um aniversário de nascimento de Gardel (o de nº 125, segundo a pesquisa do livro).
Da morte do Zorzal Criollo já fazem 74 anos, quase a idade deste "quase biógrafo", mas as repercussões continuarão por muito mais tempo.
Ainda se anuncia outra sessão de autógrafos em Porto Alegre, na Palavraria, dia 19 de dezembro.
Imagens do blog Ar do Tempo (2, 3, 6), e F. A. Vidal (1, 4, 5, 7)

Um comentário:

Manoel Magalhães disse...

Vidal, amigo, parabéns pela qualidade dos textos aqui publicados. Uma mostra de jornalismo cultural competente, como há muito não se via em Pelotas.