
Nesta quarta-feira (14), o psiquiatra Nei Guimarães Machado palestrou na Sociedade Sigmund Freud sobre os heróis dos quadrinhos à luz da psicopatologia.
Mesmo com somente uma dúzia de participantes, o encontro recordou, por momentos, a época em que o criador da psicanálise se reunia em Viena com discípulos interessados em conhecimentos novos e reveladores. Neste caso, o doutor trouxe uma proposta de fácil compreensão, cheia de arestas emotivas e útil para a discussão de aspectos mentais, sociológicos e artísticos.
O próprio Freud abordava todos os temas humanos de seu tempo, desde os mais teóricos - como a religião, a arte e a antropologia - até os mais cotidianos, como espetáculos, publicações de atualidades, tradições, anedotas e contos de fadas. Escreveu um par de livros sobre Moisés, um dos maiores heróis bíblicos. Se vivesse hoje, não teria deixado de analisar os super-heróis, os ídolos de moda e os personagens de filmes e telenovelas.

Fã dos quadrinhos que surgiram nos anos 40, Nei Machado mencionou uma dezena de figuras heroicas, passando pelas biografias deles, suas façanhas, inimigos e traços patológicos ou do desenvolvimento psíquico. Observou que os traumas de infância são decisivos na aparição de certos "heroísmos", as vinganças e até de patologias mentais.
A bipolaridade do Super-Homem (triste versão do ideal de Nietzsche) e a do Incrível Hulk (reedição do Médico e o Monstro) contrastam com a falta de superpoderes do esquizoide Fantasma.
O Capitão América teve um sentido político durante a Segunda Grande Guerra: no número 1 da revista - relatou o palestrante - "o marmanjo aparecia dando uma sova em Adolf Hitler", vilão da realidade, muito recordado como personificação de desajuste mental e social (
imagens acima). Chaplin representou esse conflito, mais elegantemente, no filme "O Grande Ditador".

Sobre o Homem-Aranha, o dr. Machado escreveu em 2002 - quando saiu o primeiro filme - que se tratava de uma simbolização do despertar sexual da adolescência (
leia o artigo). Por outro lado, Batman tem características depressivas, paranoides e homossexuais. A Mulher Maravilha representa a liberação da mulher nos anos 60, e assim por diante.
Os diversos super-heróis podem ter significados políticos - construídos com diversas características de anormalidade mental ou com superpoderes simbólicos (as cores americanas no uniforme do Super-Homem) - ou simplesmente psicológicos, com a idealização ou exagero de traços de personalidade ou de momentos do desenvolvimento humano. O mesmo pode ocorrer nos personagens dos contos, dos quadrinhos, da TV e do cinema.
O primeiro livro sobre o assunto foi "Psicanálise dos Contos de Fadas", de Bruno Bettelheim (Ed.Paz e Terra, São Paulo). Existe um livro mais amplo, com personagens modernos e alguns brasileiros (nenhum super-herói): "Fadas no Divã", de Mário e Diana Corso (Ed. Artmed, Porto Alegre).
Imagens da web (2-3) e F. A. Vidal (1)