segunda-feira, 2 de março de 2009

Conservadorismo ortográfico

A cada certo tempo, a língua portuguesa é reformada quanto à grafia de certas palavras, o que naturalmente inclui os nomes próprios. Pessoas e lugares seguem as regras do português, e as regras são as que vigoram por lei.
Quando foi eliminado o H mudo no meio dos vocábulos, este deixou de usar-se, com exceção do nome do Estado da Bahia - sem essa letra, o nome próprio parecia perder sua natureza. No entanto, os baianos - que pela ortografia vigente eram bahianos - perderam o H e não o exigiram de volta.
Em nosso Estado temos dois exemplos de cidades que resistiram bravamente à norma que estabeleceu a grafia de derivados de nomes índigenas: Bagé e Erechim. Pela regra oficial, da década de 1970, eles deviam ter ficado Bajé e Erexim, mas fizeram campanhas públicas para não alterar sua natureza, expressa no nome.
Por uma razão parecida, em Pelotas mantemos os nomes originais de certos logradouros, como o Theatro Sete de Abril, respeitosamente sempre com o TH de sua denominação original. Assim, também temos o Theatro Guarany, hoje com o Y autorizado oficialmente, e a Bibliotheca Publica, que já foi restaurada fisicamente, mas nos recorda - na grafia da denominação - a sua antiguidade.
Todas as pharmacias ficaram logo identificadas como farmácias, mas não ocorreu o mesmo com as entidades mais prezadas de Pelotas. Assim, o Diario Popular só veio a assumir o acento várias décadas depois da lei que o instituiu.
Aos turistas podemos explicar que mantemos nossas jóias inalteradas, mas é mais difícil convencer as crianças a escrever uma palavra com TH, como se fosse estrangeira, ou Publica, se na escola elas aprendem que as proparoxítonas devem ser acentuadas, sem exceção.
Se houvesse uma coerência nessa conservação, talvez eu não estivesse escrevendo esta nota. Se tão bem conservamos nossos Theatros, por que escrevemos do modo moderno as pharmacias e Asylos que igualmente nos vêm do século XIX?
Não tenhamos medo de revitalizar nosso passado através de nós mesmos. As múmias não desaparecerão com os restauros; no máximo, talvez percam alguns detalhes. O que não puder ressuscitar ficará como peça de museu, mas nós somos seres vivos. A juventude e os novos tempos nos chamam a enterrar cadáveres e ídolos, para que possamos sobreviver e evoluir.
Fotos de F. A. Vidal.

2 comentários:

Anônimo disse...

Olá, Francisco! Bonita matéria! Acho que "coerência", neste caso, seria manter os nomes tais quais foram escritos na construção original, pois se trata de obras datada, contextualizadas, construídas em condições de produção históricas e socioculturas específicas. Mas a memória de um patrimônio de uma cidade vai além disso ...
No entanto, é inegável que os nomes fazem parte disso ...
Boa matéria!
Bj!
Tê!

Anônimo disse...

Há motivos para conservar a grafia original, mesmo que vá contra o português atual, e há motivos para manter atual e viva as nossas instituições. A incoerência está em manter umas como eram enquanto se renovam outras.
Francisco