sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Ciclovias como solução

A propósito de uma reportagem do Diário Popular sobre a ciclovia da Andrade Neves (leia parte), o professor da UFPel Aluísio Barros escreveu o seguinte artigo. O jornal o publicou dia 15 de dezembro passado, em sua edição impressa somente.
Os vídeos foram indicados pelo articulista no mesmo texto, um verdadeiro post de blogue.

Vi no jornal de quinta-feira, dia 10, extensa matéria sobre reclamações de comerciantes e motoristas que dizem que as ciclovias reduzem as vagas, espantam os consumidores. São capazes até de culpar a ciclovia pela recessão! As pessoas, infelizmente, ficam impregnadas de ideias antigas, de como um dia se imaginou a cidade - a cidade do carro, onde há ruas para todos os carros e, especialmente, vagas para todo mundo estacionar bem em frente do seu destino.

A cidade modelo de hoje é bem diferente. O carro, se descobriu, é barulhento, fumacento, entope todas as vias e causa grandes congestionamentos e enorme perda de tempo. Você já parou para pensar quantas horas de vida (ou quantas vidas) são desperdiçadas todos os anos no trânsito? Numa conta rápida, quem passa todo dia uma hora no trânsito gasta 200 h por ano, o que dá 8 dias inteiros de sua vida dentro do carro.

A cidade que se almeja hoje é uma cidade mais humana, onde o pedestre e o ciclista têm a preferência. Sem barulho, sem poluição, sem acidentes. As cidades de vanguarda na Europa estão bloqueando totalmente o acesso de carros ao centro - que voltou a ser um centro de vivência, de encontro humano. O carro fica longe. E as bicicletas é que circulam!

[O articulista sugere neste ponto o trailer abaixo, falado em inglês, e o filme acima, que tem legendas.

Em Pelotas, temos uma facilidade natural para a bicicleta: a cidade é plana e as distâncias não muito grandes. Investir em ciclovias significa mais bicicletas nas ruas e menos carros e motos. Isto é, menos necessidade de ruas, semáforos e vagas de estacionamento! [...]

O que nós precisamos é de mais ciclovias, com mais qualidade. Nossas ciclovias hoje são um tímido aproveitamento de ruas bem largas. A bicicleta não deveria pedir desculpa para circular. Nossas ciclovias são estreitas. Na própria Andrade Neves, eu tenho que sair da faixa quando vem alguém na direção oposta carregando alguma coisa.

E a ciclovia da Dom Joaquim? Do lado esquerdo e quase tendo que se equilibrar nela? Sem falar nos tachões que só servem para aumentar o risco de uma queda se a roda da frente da magrela pega num deles de mau jeito. Com boas ciclovias, quem sabe a gente acaba com a ideia de que o chique é andar de carro? Por que o chique mesmo é andar de bicicleta, e com segurança!

Para terminar, eu desafio qualquer comerciante da Andrade Neves a provar que não se consegue estacionar em alguma transversal, ainda a menos de uma quadra da sua loja.


Aluísio Barros
Centro de Pesquisas Epidemiológicas
abarros.epi@gmail.com

3 comentários:

Anônimo disse...

Faltam bicicletários para acolher o ciclista que vai trabalhar no centro, nas universidades, no fórum, bancos, praças.
Falta encarar com seriedade a bicicleta, bem além da precária ciclovia.
Na UCPel tinha, para os empregados mais pobres, e foi eliminado. Para os empregados mais "educados", os professores, tem as garagens para carros.
No Brasil um auto-intitulado empresário sem eira nem beira visita o prefeito e arranca dele um projeto ferindo o plano diretor. A decisão pró-negócios é tomada na hora.
Mas uma idéia racional e econômica para a coletividade, repaginar sua cidade, até um currículo escolar orientado para a bicicleta sob pressupostos coletivos ... jamais ...
Holanda e Dinamarca são outra cultura. Holanda é uma sociedade que vive abaixo do nível do mar, individualismo no caso deles significa submersão do país.
Dinamarca descende dos vikings, as pessoas lá, na pior das hipóteses eram vizinhos, marinheiros, companheiros de armas, jamais escravos. Isso criou laços sociais solidários entre elas, o "capital social".
Outra coisa a notar é o padrão construtivo europeu, que exige ventilação nos prédios e nas quadras. São aqueles enormes pátios internos e essas ruelas secundárias.
Aliás, para hoje se espera a decisão sobre a retomada de uma vila no Fragata próximo ao quartel, retomada que deriva de um processo fracassado, mal conduzido, de usucapião.
A decisão vai favorecer quem ?
O coletivo e de longo prazo, ou o privado ?
O Brasil de urbanização recente ignora o coletivo e a função da ágora, quase não existe calçada, praça é uma pobreza, o carro é máximo da realização pessoal e deve ser usado para tudo.

Anônimo disse...

O que, ir à missa ou ao teatro sem chouffer ?
Jamais !!
Bicicleta é para a ralé, devia ser proibida pela ansiedade que nos causa na eventualidade de atropelarmos o serviçal de alguém.

Francisco Antônio Vidal disse...

Pelotas é geograficamente propícia para o uso da bicicleta, mas culturalmente o veículo mais barato e ecológico é segregado como feio, perigoso e associado à pobreza. Os prepotentes de carro querem atropelar os desvalidos que pedalam, e os ciclistas não contam com segurança contra roubos. Riqueza tecnológica oprimindo a pobreza do ser humano.

No Brasil temos outro estranho sintoma: ciclistas atropelando pedestres, e até se veem pedestres invadindo as pistas para bicicletas (é um dos maus costumes pelotenses, comum no Fragata).

Em todo o uso do espaço público, predomina o egocentrismo e a falta de respeito ao bem comum, desde o governante até o mais humilde cidadão. Antes eram os fazendeiros atropelando escravos; hoje são os motoboys sem noção de cidadania.