A água, este produto cada vez mais raro no mundo, ainda abunda no arroio Pelotas, o maior manancial do município — tombado por projeto legislativo do saudoso Bernardo de Souza, ex-prefeito de Pelotas e ex-deputado estadual — , fazendo parte formal de nosso "patrimônio histórico" por sua importância ecológica, seu efeito social, sua potência turística e muitos outros atributos.
Em suas margens estabeleceram-se diversas charqueadas, que tanto renderam e renderão, para Pelotas. As primeiras lavouras comerciais de arroz foram por ele irrigadas, por volta de 1907, quando o coronel Pedro Osório investiu nesse produto do qual foi "rei", na Fazenda do Cascalho. Em seguida, ainda no Cascalho, foi construído o primeiro engenho de arroz do Brasil, com a produção escoada por chatas via arroio Pelotas.
O início da cultura do aspargo e do cultivo comercial de frutíferas de origem europeia, deu-se também no Cascalho, na década de 1930, desta vez por conta do genro de Pedro Osório, Paulo Affonso de Sá Rheingantz, às margens do arroio Pelotas.
Fonte de água para milhares de hectares de arroz, durante muitos anos com o dimensionamento das lavouras baseado na capacidade hídrica desse arroio respeitada pelos arrozeiros, não me lembro de alguma vez ter visto tanta terra lavrada, tanta maracha formada, tantos levantes construídos em suas margens, como neste ano.
É verdade que houve época em que diversos arrozeiros, quando as águas do arroio começaram a salgar, construíram verdadeiros, inconvenientes e antiecológicos diques, com sacos plásticos para adubo cheios de terra ou, muitas vezes, outros materiais, que lá ficaram assoreando seu majestoso leito.
Meio natural de sobrevivência de diversas espécies de peixes, de tartarugas e cágados, de jacarés, de lontras, de capinchos, enfim, de uma boa fauna e de uma flora ainda farta e bonita, o arroio Pelotas vem sendo exaurido por pescadores e caçadores, seguidamente com redes em parte ou toda a largura de seu leito. E, próximo às suas margens, cada vez mais areais estão sendo estabelecidos, merecendo um grande controle do Ibama para não se tornarem prejudiciais (assoreamento, concorrência hídrica, redução de fauna e flora etc).
Dezenas de residências, vários clubes sociais e esportivos, diversas charqueadas históricas utilizam suas margens, muitas vezes embelezando-as, tornando-se o arroio uma verdadeira pista para o turismo, para o saudável esporte aquático, importante para auxiliar o desenvolvimento sadio de nossas crianças e adolescentes.
A quantidade de água do arroio Pelotas e sua qualidade leve (exceto quando da aplicação indiscriminada de defensivos agrícolas na lavoura de arroz), possibilitam seu aproveitamento a curto prazo para o consumo humano, desde que tratada devidamente, deixando a região sem o perigo mundial da falta de água para sua população.
Morador em sua margem direita desde o ano de 1948, onde e quando nasci, mesmo nos 20 anos em que tinha endereço na cidade de Pelotas, não me lembro de ter visto seu nível tão baixo em plena primavera. É impressionante, até mesmo assustador. A probabilidade de salgar precocemente é muito grande (já está acontecendo na Lagoa dos Patos) como ocorreu em dezembro de 2008, interrompido pela grande enchente no final de janeiro de 2009, fato que deverá ser acelerado pela exagerada quantidade de levantes atualmente instalados em suas margens.
Chamo a atenção de seus moradores, do Ibama, dos partidos políticos - principalmente os ditos ecológicos -, dos ecologistas, das ONGs ecológicas, das instituições preocupadas com o meio ambiente, dos representantes políticos, que um grande e forte movimento deve ser implantado para evitar o mau uso das águas do arroio Pelotas, a devastação de sua vegetação marginal, a caça e a pesca indiscriminadas de sua fauna, o assoreamento de seu leito, para controlar e evitar que esse nosso fantástico filão de água se esgote.
E se ele secar?
Imagens da web
4 comentários:
Vivemos o ensaio de um seca braba, extraordinária.
Se tem algo a ver com efeito estufa, não dá para dizer.
São dias muito secos, a vegetação precisa tirar mais água do solo.
Aqui em casa as plantas parecem inchadas e demasiadamente "repolhudas", sem no entanto darem frutos. Parecem saudáveis, só negaram frutos.
A drenagem do arroio pode estar ocorrendo pela própria vegetação das suas redondezas, pois o arroio parece ser o mero afloramento do lençol freático, posto que a jusante, lá na BR, ele é um filete de água inexpressivo.
Ele não existe tanto pela água que recebe das suas nascentes, mas pela água que aflora na baixada. Drene a água pela agricultura ou pelas árvores que sugam demais do solo e o arroio seca.
Quanto a ser patrimônio público e ter acesso público, e em virtude disso merecer tombamento, é uma hipocrisia descarada, o público só tem acesso a ele em uma pequena rua humilde perto da via dos bagres, o restante das suas margens são tomadas por clubes, fazendas e charqueadas tão decadentes como horrorosas (hotel ou restaurante precários), e lotes privados, não conheço praia, marina pública ou parque público que permita à população acesso recreativo amplo a suas águas.
Dessa privatização tradicional e incontestada, advém a fraca indústria náutica recreativa do município.
Se o Estado declara o arroio patrimônio público não deveria limitar as liberdades dos privados que se consideram donos do rio, e as liberdades de entidades comerciais que poluem?
A natureza pode se movimentar salgando ou drenando o fluxo de água doce, mas fica a impressão de que nós estamos dançando e cantando no salão de festas enquando o barco faz água.
Se ele secar o pelotense "tá ralado". E um dia vai, sabe por quê? A jusante (abaixo) da barragem do sinot, existe uma empresa de mineração extraindo areia do leito do rio. Para extrair essa areia do meio do rio - sim, porque nas margens já não existe mais areia comercial, a empresa em questão construiu uma estrada dentro do rio. Uma estrada dentro do arroio pelotas! Isso não é de hoje, deve ter um cinco anos no mínimo e tudo com a assinatura da prefeitura e do órgão ambiental estadual. Para compensar essas cavas em seu leito, o rio tem que se adaptar a essa nova condição não natural. Rebaixando o leito do rio, o lençol freático também é rebaixado. Aos poucos, o rio vai perdendo a capacidade de retenção d´agua e ganha a capacidade de absorção, isto é, o rio absorve mais água do que consegue reter. Com a palavra, os órgãos ambientais. Saudações. Carlos Henrique Mendes, carlos.mendes@gmail.com
Obrigado pelo comentário. Poderia explicar a diferença entre o leito absorver e reter a água?
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