No segundo semestre daquele ano, o Instituto Profícere apresentou o ciclo de encontros mensais “A obra de Shakespeare no cinema-tragédia”. Foram projetados 4 filmes sobre textos de Shakespeare e a professora de inglês Flávia Adriana Andrade palestrou sobre cada livro e filme (Hamlet, Otelo, Rei Lear, e Romeu e Julieta).
Realizadas em sextas-feiras de agosto a dezembro, das 19h às 22h, as reuniões tiveram participação da palestrante e quatro pessoas como público espectador-debatedor. As versões de cinema escolhidas para análise estavam modernizadas, não dando a impressão de terem sido escritas há 400 anos. Um quinto filme (Macbeth) estava no programa mas terminou sendo cancelado.
O preço de 15 reais por sessão (destinado a cobrir a vinda da professora desde Porto Alegre) pôde ter causado o baixo número de interessados, mas nos anos seguintes novos ciclos foram realizados no Profícere de forma gratuita, com maior público. A experiência de 2007 foi positiva para os poucos participantes, mesmo tendo evidenciado a diferença socioeconômica e cultural que ainda temos com a capital.
No passado, Pelotas pôde estar em bom nível cultural, mas hoje não passa de uma cidade do interior que se esforça para acompanhar o ritmo moderno. Estaremos pensando em caveiras de mortos ilustres por ser desenterrados e vingados? É possível escolher entre ser ou não ser quem se é? Viver ou não viver?
O Shakespeare multivariado
Cada livro do dramaturgo inglês (1564-1616), é uma obra-prima que admite múltiplas leituras: literária, histórica, filosófica, psicológica, política. No cinema, a primeira filmagem de um texto seu foi em 1899 e até hoje se produzem novas versões de suas obras, inclusive transpondo-as a vários gêneros. Várias óperas e balês já se basearam em peças suas.
O filme “Planeta Proibido” (1956) se baseou em “A Tempestade”. O musical “Amor, Sublime Amor” (1961) revive a história de Romeu e Julieta no bairro West Side de Nova Iorque. A história do “Rei Lear” foi transportada ao oriente por Akira Kurosawa no filme "Ran" (1985) e trazido à época moderna por Jean-Luc Godard (King Lear, 1987). “A Sociedade dos Poetas Mortos” (1989) inspira-se em “Sonho de uma Noite de Verão”, obra shakespeariana que também Woody Allen reciclou a seu modo, em "Comédia Sexual de uma Noite de Verão" (1982).
Hamlet, uma tragédia edipiana
Baseada numa lenda da Dinamarca do século V, a história de “Hamlet” começa com a notícia da morte do rei desse país. Seu irmão Cláudio ocupa o trono e desposa a rainha viúva, mas o príncipe Hamlet acha que foi Cláudio quem matou seu pai para ficar com o poder (e com sua mãe). Cria-se um ódio mútuo e um tenta matar o outro.
A peça admite uma leitura política, mas se estrutura como um dramalhão familiar, e nesse sentido Sigmund Freud a comparou com o Édipo de Sófocles ("A Interpretação de Sonhos" e “Um Estudo Autobiográfico”). Ernest Jones desenvolveu o tema no livro "Hamlet e o complexo de Édipo" (Hamlet and Oedipus, 1949). Para assumir o poder (ao lado da rainha), Hamlet e Édipo, cada qual em seus contextos, se enfrentam à figura paterna, assim como cada um de nós precisa ocupar o lugar do genitor do mesmo sexo, para passar da infância à maturidade — é o que explica Freud.
Escrito cerca do ano 1600, “Hamlet” já inspirou uns 70 filmes dramáticos, desde 1907 até hoje. Os mais recentes são o de Kenneth Branagh (1996), situado no século XIX mas bem apegado ao texto original, e a versão de Michael Almereyda (2000), ambientada na neurótica vida americana dos dias atuais. Este último “Hamlet” foi o escolhido para abrir este Ciclo de Filmes Comentados, no Instituto Profícere.
Veja abaixo a cena em que a namorada Ofélia (Julia Stiles) devolve cartas que Hamlet (Ethan Hawke) lhe escreveu, enquanto os dois são espiados por Cláudio e pelo pai dela. Nesta modernização, a espionagem é feita mediante um microfone oculto, e tudo está rodeado pelos vertiginosos arranha-céus de Nova Iorque, inclusive as ainda existentes Torres Gêmeas.
Imagens da web
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