domingo, 28 de fevereiro de 2010
Amigos de Pelotas lança caderno cultural
Os 4 colaboradores que estreiam hoje definem o estilo jornalístico de uma revista semanal: Cíntia Langie, Marcos Macedo, Minduim (que vêm com experiência de escrever no Amigos) e Renata Requião, doutora em Literatura, que fez parte do secretariado do ex-prefeito Marroni.
Inicial dilema a tratar: o significado da palavra "cultura". O colunista Minduim (esq.) aborda este problema, defendendo a definição ampla que inclui, bem além da arte: costumes, tradições e história, folclore, gastronomia e culinária, constituição social e étnica. São elementos que buscam a construção da identidade de grupo, um sentido afetivo e amoroso, inerente aos interessados pela cultura em geral.
O Amigos/Cultura vem enriquecer a cena pelotense, onde já existiam desde 2009 o sítio E-Cult e este blogue, Pelotas, Capital Cultural, analisando o cotidiano pelotense. Como os fins de todos parecem ser os mesmos, cada um terá que definir seu estilo com precisão, seja que prefira competir pelos leitores (em prol de si mesmos) ou colaborar mutuamente, em prol dos leitores e da melhor cobertura cultural. Em qualquer caso, é Pelotas que sai ganhando.
sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010
O que é o mickeymousing?
Textura musical
Em composição musical, o termo "textura", proveniente da física, se refere à organização e complexidade das vozes instrumentais. Uma "voz musical" pode ser um instrumento solista, uma voz humana ou todo um naipe (conjunto de instrumentos ou de vozes humanas). Considerando as linhas melódicas como o material da música, este se agrupa e se entretece formando o resultado final que ouvimos.
A textura musical se avalia, geralmente, em termos de densidade: as texturas menos densas contêm poucas vozes, geralmente solistas, em formas rítmicas simples; as mais densas têm um arranjo complexo, com vários instrumentos em grande variação rítmica. Foram apresentadas cenas de 3 filmes para exemplificar a baixa ou alta densidade da música: Sangue Negro (compositor: Jonny Greenwood, 2007), Matrix (Don Davis, 1999) e Apocalypto (James Horner, 2006).
Mickeymousing
Assim como a música de concerto pode ilustrar sentimentos, movimentos da natureza ou até situações visuais, no cinema a música tem uma função essencialmente descritiva. Quando ela é sincrônica com a imagem, a marcação imitativa - adequada para ações cômicas - às vezes fica óbvia demais, podendo incomodar tanto como alguém que relata em voz alta, aos espectadores de um filme, as ações que todos já estão vendo.
A sincronização de música e imagem começou - fora do cinema mudo - quando alguns pianistas improvisavam o fundo musical olhando a ação na tela. Foi desenvolvida nos desenhos animados de Walt Disney (1901-1966), onde cada nota musical era feita para concordar passo a passo com as ações dos personagens (vídeo acima, de 1935). Criado em 1928, Mickey Mouse foi o primeiro e preferido personagem de Disney, ficando associado com esse procedimento. Nos filmes com atores, as trilhas musicais usaram esse efeito de repetição, até que o termo ganhou conotação pejorativa. Os seguintes trechos ilustraram nesta aula o mickeymousing:
- O Informante (música de Max Steiner, 1935): cenas de rua, com a música onipresente ilustrando os movimentos e até os pensamentos dos personagens principais (veja aqui).
- Psicose (Bernard Herrmann, 1960): o assassinato no banheiro (veja a cena) é acompanhado por violinos em glissandos obsessivos, imitando o movimento cortante de facas e o som de gritos agudos (ouça a peça para cordas).
- Pollock (Jeff Beal, 2000), o pintor cria um mural cheio de detalhes enquanto o compositor "pinta" um quadro musical equivalente.
- Fantasia (vídeo abaixo, de 1940). Aqui a tática se inverteu, excepcionalmente: os animadores de Disney compuseram as cenas para a música já gravada. Se nos anos 30 os acordes frisavam os movimentos de Mickey, neste trecho o camundongo veio gesticular a música de Paul Dukas "O Aprendiz de Feiticeiro".
No cinema, a música ganhou outras funções, como a de anunciar situações iminentes ou intenções de personagens. Ainda assim, ela poderia ser vista como uma "descrição antecipatória", enquanto o mickeymousing passou a ser visto como uma descrição redundante e os compositores buscaram modos mais criativos e elegantes para acompanhar as cenas: por exemplo, deixar partes sem música e só ilustrar o que a poética visual não pode dizer.
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010
Curso de verão: Entendendo a música do cinema
Este verão, o Conservatório de Música abriu cinco cursos de extensão dirigidos à comunidade pelotense: Violino e viola, Musicalização em flauta doce, Introdução à etnografia em música, e Entendendo a Música no Cinema (em dois módulos). A novidade foi divulgada quando a cidade em geral já havia entrado em férias, mas com o tempo poderá estruturar-se uma verdadeira escola de verão na UFPel, numa Pelotas que costuma esvaziar-se totalmente nos meses de férias.
Hoje de manhã (dir.), o curso Entendendo a Música do Cinema (módulo 2 ) foi iniciado por Jorge Meletti, mestre e doutorando em Composição Musical (UFRGS) e professor na UFPel. Metade das 20 vagas gratuitas foram preenchidas, quase que somente por alunos da Universidade; algo parecido ocorreu no módulo 1, ministrado na segunda semana de fevereiro por Carlos Walter Soares, também mestre em Composição Musical.
Meletti planejou o curso de 20h para um público leigo em música, mas os alunos que chegaram já tinham conhecimentos na área, o que redirecionou a abordagem e a participação em grupo. O método das aulas consiste em alternar conceitos teóricos com exemplos comentados de cenas de filmes, abrindo à discussão. O objetivo: compreender as funções da música no cinema e as formas de compor as trilhas sonoras dos filmes.
Os trechos comentados esta manhã foram os seguintes (compositor entre parênteses):
- A Missão (Ennio Morricone): cena de Gabriel tocando oboé. A música se situa dentro da ação, é ouvida pelos personagens (conceito de música diegética).
- A Profecia (Jerry Goldsmith): Demian grita na frente da igreja. A música está fora da cena, faz parte de uma trilha sonora (música extradiegética).
- O Rei Leão (Hans Zimmer): salvamento de Simba no estouro de búfalos. A trilha musical descreve a cena e antecipa possibilidades; contém simbolismos no tipo e na quantidade de instrumentos (tambores africanos), no timbre de metais que representam o herói e em quatro notas do trecho Lacrimosa, do Requiem de Mozart.
- Veludo Azul: trechos de canções na boate, com a atriz Isabella Rosselini. A música é parte da cena, e ouvida pelos protagonistas. Neste caso, para indicar passagem do tempo, o diretor David Lynch (ou o editor de som) introduz um fragmento orquestrado entre duas canções (vídeo abaixo, minuto 1:18 - 1:24), que não está na realidade da cena (música ambidiegética, de duas origens).
- Apocalypse Now: helicópteros atacam vilarejo vietnamita. A música é ouvida pelos personagens mas o diretor do filme a usa como trilha sonora simultaneamente, parecendo identificar-se com o oficial que dirige o ataque e comparando as aeronaves às míticas valquírias, guerreiras aladas que influem nas batalhas (veja trecho de 18 min do filme; a música vai do minuto 3:22 a 9:00). A alusão musical remete à abertura do 3º ato de uma ópera de Wagner, "As Valquírias"; a alusão política é ao nazismo (leia explicação no blogue Cinematório).
- O dia em que a terra parou (Bernard Herrmann): em diversas cenas, ouve-se o estranho som do teremim, instrumento eletrônico criado por Leon Theremin (nome francês do russo Lev Termen). Sem instrumentos de cordas, a música ora se faz imperceptível, ora enfatiza o dramatismo das cenas visuais.
sábado, 20 de fevereiro de 2010
Sete passos (poema)
E ao entardecer o sol recolhe sua luz difusa
Gela meus sentidos ao ver a chuva encher o mar de poesia
E adoeço sozinho ... enquanto chove solidão nas águas turvas
São apenas sete passos ... e o mar já está transbordando
E mergulho de olhos fechados
E quanto mais profundo entro em mim mais sufocado fico ... procurando
Entulhando a base com promessas vazias ... não concretas ... densas como o lodo ...
E esse mar é sujo e entupido de remorsos que atrapalham o submergir
E afundo mais ... agitando os pedaços ... fragmentos da minha história
Essas tintas escuras que turvaram minhas águas ... são sete passos até a praia
Mas afogo nos meus dejetos pessoais e perco a consciência
Pedaços de bonecas sem cabeças ... personagens de filmes ruins ... escritores medíocres
Chove no mar ...
É tarde e o sol segue sua volta no globo ... levando luz a outros pontos
E perco os sentidos ao ver escrito na areia efêmera o pedido de socorro do meu ego doentio
Sobram sete dedos
E peco e padeço sozinho
Mergulhando em águas escuras e revoltas de olhos abertos
A solidão evapora e completa seu ciclo ... desaguando nas bonecas sem cabeças
São só sete passos ... são só estrofes ... mas o mar é denso e não é possível mergulhar na obra
Concreto e lama salgada descem de olhos mesquinhos ao ver a chuva em alto mar ...
E quando a tormenta chega à praia
Faltavam apenas sete passos ...
Verbalizar o lamento
Nadar na própria frustração
Entender o procurar
Mergulhar no escuro
Endurecer no sofrimento
Admitir que o fundo é o ápice
Ser apenas humano inseguro
sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010
Vítor Ramil fala de sua obra literária
A produtora Moviola tem um programa semanal na Rádio Com, dedicado a falar de cinema, mas que conversa com artistas e intelectuais, com o cinema como ponto de partida (ou de chegada). Às vezes são editados vídeos com partes de um programa. O Programa Moviola vai ao ar toda segunda-feira, das 22h30 à meia-noite, podendo ser ouvido no ar (104.5 FM) e no sítio web da Rádio Com.
Como não se está filmando um programa de TV, o documentário aparenta ter descuidos visuais (como uma pobre iluminação), mas lembre que a filmagem foi feita num programa de rádio e o uso da câmara representa um "espectador" no estúdio, concentrado nas palavras e não nos gestos. A apresentação é feita por Alexandre Matos e mais adiante aparece a voz de Cíntia Langie, diretora da Moviola.
Com três canções de Ramil como fundo, o tratamento das imagens urbanas quer sugerir uma transcrição de Satolep ao cinema (repare na Catedral, a Prefeitura, o Café Aquários). O livro saiu em 2008 (foi terminado em 2007). O escritor-músico redige com imaginação cinematográfica, mas não com o objetivo de ser filmado; em todo caso, Vítor acha que mereceria, pelo menos, uma superprodução e que Wim Wenders seria o cineasta que "poderia dar conta da questão humana, interna, da obra".
A cidade é uma extensão da família da gente. Pra mim é importante ter uma boa relação com a cidade, que ela saiba o quanto eu gosto dela e que eu sinta também que a cidade gosta de mim. Com Satolep houve esse retorno com a cidade.
quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010
Paralelos entre a psicoterapia e o tênis
Na ocasião, o psiquiatra Hémerson Ari Mendes foi convidado para tratar um tema de sua preferência e, sem sair dos limites da prática psicanalítica, abordou um tema lúdico e pedagógico para os psicoterapeutas e interessados na área "psi".
Tenista amador e, na época, professor de Psicologia Médica na UFPel, Hémerson brincou com a comparação entre uma partida de tênis e um encontro terapêutico, transmitindo seu entusiasmo pela ciência, pelo ensino, pelo esporte e pela arte... da psicoterapia.
Sempre com fluência e bom-humor, o psicanalista-tenista explicou umas 50 semelhanças entre ambas atividades, dando exemplos práticos e pessoais, tudo sem ler notas nem fazer pausa alguma, no ritmo de um “lançamento” a cada 90 segundos.
Já distante do agitado campo de jogo, pois a palestra também pareceu uma partida de tênis, reli os apontamentos e fiz uma tentativa de classificação, que a seguir transcrevo, ficando-me a impressão da coerência e interesse dos conteúdos.
Os paralelos são mais evidentes entre a sessão psicológica e a partida de tênis, duas formas de diálogo humano e real, sob certos limites e normas:
- Ambas são encontros entre duas partes,
- situadas frente a frente,
- em um setting (enquadramento) espacial e temporal.
- A interação é mental nos dois casos, com a bolinha representando o foco das idéias verbalizadas, na alternância da palavra.
- Mas ela é também, inevitavelmente, corporal e sensorial;
- se feita virtualmente, perde seus benefícios (detalhe não mencionado na palestra).
- É preciso um adestramento mecânico (bater bola/bater boca), mas o jogo consiste em fazer pensar, conhecer o outro, provocar mudanças.
- A duração de ambos, breve ou longa, depende das ações de cada participante – criativas, agressivas ou defensivas.
- A relação terapêutica precisa equilibrar o uso da força (nos dois participantes), assim como o tenista segura a raquete: nem com muita dureza que prejudique o vínculo, nem afrouxando demais que este se dilua.
- A mão deve aplicar um peso, fazer sentir uma pressão (para evitar a derrota pela neurose), mas só até certo ponto, pois uma ação violenta gera reações parecidas (defesas neuróticas ou psicóticas).
- Ambos processos conjugam a empatia mútua (atirar a bola para que o outro a apanhe, como no frescobol, jogo mais típico de namorados) com a existência de dificuldades e desafios (construir uma jogada nova, para que o competidor responda à exigência e, se puder, se saia bem).
- Na terapia e no tênis, há um prazer inerente ao jogar, mesmo que não se ganhem pontos.
- ambos têm objetivos e preferências pessoais, que às vezes interferem na aprendizagem ou na terapia.
- Um aprendiz e um neurótico querem adquirir recursos adaptativos para chegar a suas metas.
- Aluno e paciente podem ver o orientador como um modelo a seguir na vida, o que facilita simpatias e antipatias específicas.
Na atividade em si mesma, também há semelhanças entre o que o jogador e o terapeuta fazem: alguns seguem fórmulas, enquanto outros fazem as coisas sem consciência dos detalhes, na base dos talentos naturais. Para não errar, é preciso olhar a bola-foco (ao recebê-la), enquanto nos lançamentos a visão deve concentrar-se no objetivo.
Após um debate com os assistentes, Hémerson deixou uma instigante idéia para pensar: O jogo não termina; é importante manter-se nele, pois sempre há mais jogadas, mesmo que nos sintamos momentaneamente perdidos.
Na palestra não se mencionaram diferenças entre o esporte e a terapia, mas elas existem e são importantes: os jogadores competem um contra outro em busca de um troféu, o tênis ocorre geralmente com público olhando e torcendo, há campeonatos e hierarquias de tenistas mas não de psicólogos, na terapia os participantes não podem alternar entre análise e relação sexual.
Estes e outros paralelos entre o tênis e a vida mental humana podem ver-se no filme inglês Wimbledon, de 2004. Em português chamou-se “O Jogo do Amor”, nome que para nós já é uma alusão ao encontro terapêutico.
Fotos da web
quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010
Primeira exposição de Solange Lange
Trata-se de naturezas-mortas e paisagens, tipo de trabalho de uma fase inicial de estudo, onde o artista desenvolve técnica sem necessariamente transmitir mensagens novas. Nas telas predomina o verde e pontilham cores vivas como o vermelho (abaixo), sem perder o realismo da natureza - junto ao entusiasmo e à vivacidade sugeridos por essas cores.
Imagens Corredor Arte
Passa a bola: o futebol da vida
Sábado passado (13), o filme "Futebol, Sociedade Anônima" (2009), da produtora Moviola, conseguiu um verdadeiro prêmio: ser exibido na televisão para milhares de espectadores, no segmento "Curtas Gaúchos", da RBS. Até agora, este trabalho de Cíntia Langie e Rafael Andreazza só havia sido projetado em ocasiões especiais, nunca em cinemas regulares nem na internet.
A equipe criativa tratou um tema humano universal num local assumidamente pelotense, cotidiano e atual: o bairro Simões Lopes, na fronteira entre o centro e a periferia, entre a vida e o abandono. Na estação férrea em ruínas, um sonhador de outra época ainda espera o trem. No jogo da vida, as emoções e o desespero para conseguir coisas reais. A denúncia não poderia ser mais clara e ao mesmo tempo mais sutil.
No clipe musical que a mesma equipe produziu, um irônico Edu daMatta dá conselhos enganosos aos pelotenses: não espere o trem, esqueça seus ideais, não se apaixone, fique na zaga, deixe os outros fazerem o gol, não fale com o motorista, tente agradar a sua mãe e ao diabo. Será que alguém vai se dar conta desses impossíveis e fazer o contrário?
Se você vê que isso não dá pé,
Não deixe uma pétala na flor de bem-me-quer
Para saber se ela ainda te ama.
Não meta a mão no fogo por ninguém
E não pergunte informação ao maquinista deste trem
Para saber se ela foi embora.
Passa a bola, Mané,
Que tu não tem as perna torta nem chuta no gol
E no teu time todos querem ser o Dez.
Não meta a mão no fogo, meu irmão,
Tu vai encontrar outra mulher,
Como a tua mãe queria, como o diabo quer.
Lixão em zona residencial
De início, o post mostra a esquina da Dr. Cassiano com Álvaro Chaves, hoje um terreno vazio e abandonado (esq.), no meio de zona residencial em pleno centro de Pelotas. O cartaz diz: "Proibido colocar lixo".
O blogueiro, Sérgio Fontana, comenta que essa imagem de relativa limpeza sugere que a proibição foi respeitada e que, de fato, num raio de 20m em torno à placa, não há lixo amontoado. Mas logo descobre a ação do "jeitinho brasileiro". Leia abaixo o resto da nota (ou a original: Povo desenvolvido é povo limpo).
– Como o povo pelotense é educado! – diria um possível visitante deste blog.
Em seguida, o mesmo visitante se depara com a foto abaixo, imaginando que se trata de uma imagem obtida num país muito pobre e desgovernado, onde a infraestrutura viária e as leis ambientais simplesmente não existem.
Aí [umas linhas abaixo], ele descobre a verdade. O terreno é o mesmo da primeira foto, só que uns [40] metros adiante, um pouco mais longe da placa de advertência, e tem muito lixo [orgânico e inorgânico] que, dia a dia, parece que vai aumentando.
Ele, o internauta, passa a não entender como isto pode [ou pôde] acontecer, uma vez que o povo pelotense é muito educado e jamais jogaria lixo em local impróprio.
E antes que alguém diga que são as pessoas mais pobres e desassistidas que fazem isto, eu rebato, afirmando que também elas o fazem, mas não só elas. Já vi muita gente [que se autodenominaria] "de nível" jogando lixo ali, desrespeitando a própria sociedade em que vive.
A educação de um povo, em longo prazo, tem tudo a ver com a educação da criança. Mas isto não depende só da escola: depende muito mais das estruturas familiares que, na minha opinião [no Brasil], são o elo mais fraco dessa corrente que – é evidente – tem outros "elos" a serem considerados.
Fotos de Sérgio Fontana
terça-feira, 16 de fevereiro de 2010
História de um pardal (crônica)
Enquanto não se edita uma coletânea de suas antigas crônicas, o autor compartilha algumas conosco. Entre suas preferidas está o seguinte relato de memórias, daqueles que deixam pensando pelo resto da vida. Situado nos anos 30, foi escrito e publicado na década de 1980, mas vale a pena reler, por seu sabor de permanência.
segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010
UFPel no Tempo: mostra documentária
A série contém parte do material da exposição "Unidades Fundadoras da UFPel", que de agosto a outubro de 2009 apresentou aspectos históricos da Universidade que completava então 40 anos (veja nota). Ela se constituiu em agosto de 1969, aglutinando escolas locais, científicas e artísticas, algumas delas fundadas no século XIX.
Os curadores das duas mostras - Francisca Michelon, José Luiz de Pellegrin e Raquel Schwonke - prepararam um elemento que serviu de brinde e catálogo para os visitantes: uma coleção de 9 postais em recipiente próprio, com uma foto e um mini-histórico de cada uma das 10 unidades fundadoras (dir.).
Os pelotenses conhecem essas unidades por sua atuação permanente junto à comunidade, mas ignoram sua origem e a complexidade histórica de cada uma - e do conjunto delas, que é a Universidade Federal de Pelotas. Agora que ela passa por uma expansão, atraindo professores e estudantes do resto do Brasil, esta documentação precisaria seguir rodando pela cidade e pela Zona Zul, para que conheçamos e valorizemos nosso patrimônio.
Exemplo desses vazios de conhecimento em Pelotas é o Horto Botânico Irmão Teodoro Luís, pertencente hoje ao Instituto de Biologia da UFPel, no campus Capão do Leão. Criado em 1945 como Horto Florestal de Pelotas, passou a ser o Horto Botânico do Instituto Agronômico do Sul.
Entre as fotos destas duas exposições, encontra-se uma do Irmão Teodoro Luís em oração (esq.), como Jesus no Horto das Oliveiras. Não há indicação de data; somente pude averiguar que o Irmão nasceu em 1904.
Professor de geobotânica, de nome civil Ramón Malagarriga y Heras, o lassalista espanhol fundou o Jardim Botânico de Porto Alegre, e veio de Canoas (RS), na década de 1940, para organizar este verdadeiro laboratório de pesquisa científica em Pelotas, que hoje leva seu nome religioso.
Fotos: F. A. Vidal (1) e UFPel (2)
domingo, 14 de fevereiro de 2010
"O último jogo", filme experimental de suspense
Num dos primeiros trabalhos acadêmicos produzidos no curso de Cinema e Animação da UFPel (hoje chamado Cinema e Audiovisual), o curta-metragem "O último jogo" relata uma conversa de três amigos sobre casos sinistros, enquanto jogam cartas no Café Monjolo (próximo ao Instituto de Artes e Design). Aparentemente os três fatos tinham a mesma origem, a qual levaria a um desenlace comum.
O futuro cineasta reconheceu pequenas falhas no tratamento de imagens, mas revela boa mão no manejo da música e da edição para o relato de suspense. Para o espectador, o principal vazio desta opera prima de Diego Geisler (2008), é que carece de créditos, como se fosse somente uma brincadeira entre amigos.
quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010
Por que Pelotas não quer shoppings?
O leitor Gilvane Ferreira Garcia, pelotense residente em Porto Alegre, fez aqui no blogue uma reflexão para despertar respostas, em busca de entender qual seria nosso impedimento para crescer como o resto do mundo. Isso foi em junho de 2009. Como não houve reações, recoloco o assunto, que seguirá em próximas postagens, analisando aspectos do mesmo problema.
Quando Pelotas terá um "shopping center de verdade"?
As respostas mais típicas à pergunta dele (em azul, acima) costumam ser negativas:
– Nunca, pois os grandes empresários locais não permitirão competidores.
– Pelotas não precisa de shoppings para valorizar-se e crescer.
O tema dos shoppings é polêmico e de complexa resposta. Incomoda a muitos pelotenses, por evidenciar uma tendência ao estagnamento econômico, paradoxo vergonhoso para a que foi cidade rica até inícios do século XX.
Pelotas está hoje povoada de ruínas de centros comerciais –como a carcaça inacabada na Bento Gonçalves com Santos Dumont (dir.) – e de amplos terrenos baldios que esperam dias de glória.
Alguns poucos se dão conta de que as contraforças que impedem o progresso provêm desde dentro de Pelotas... mas nada podem fazer. Outros parecem aprovar a falta de shoppings, que representariam a banalidade, o consumismo e a invasão de multinacionais. O "consolo" nesse caso não ajuda, pois estas pessoas seguem sonhando com ideais.
Será uma resistência da elite empobrecida? Ou maldição que restou das charqueadas? Um exemplo antológico de abandono é o edifício inconcluso (abaixo), que ia ser um centro comercial, enorme lixo urbano em pleno centro histórico, há uma década levantando a bandeira da decadência (que paradoxo).
A seguir, uma condensação do texto que o leitor propôs ao debate.
Dizem que Pelotas é um "shopping a céu aberto"; que tem um comércio pujante; que abarca quase "um milhão de habitantes" da região que a cidade centraliza; enfim, teoricamente Pelotas reúne todas as condições para sediar um centro de compras na modalidade de shopping center.
Por que Pelotas até hoje não recebeu de uma grande rede desse segmento uma atenção direta ? Vários foram os projetos apresentados. Várias vezes foi anunciado que, enfim, Pelotas teria o seu shopping. Até "coquetel de lançamento ocorreu no Dunas", pelo que li no "glorioso" Diário Popular. Porém, na prática, nada avançou.
Enquanto isso, o que se vê ? Cidades de menor representatividade – seja em população, seja até em poder econômico, até mesmo pelo tamanho – já contam com centros comerciais. Canoas amplia o seu shopping; Novo Hamburgo terminou recentemente a ampliação do seu; Santa Maria inaugurou ou está prestes a inaugurar o seu; Passo Fundo está ampliando o seu já conhecido e bonito " Bella Cittá", e por aí vai.
E Pelotas, até quando? Alguém teria uma explicação, plausível ao menos, para esse "retrocesso e por que não dizer, ostracismo comercial da cidade"? Gostaria de ouvir a opinião do segmento empresarial da cidade e região.
Já que nenhum grande grupo manifestou interesse, façam como Passo Fundo: eles construíram um shopping para a cidade com dinheiro da "terra". Pelo que sei, dinheiro não seria o problema, mesmo porque há empresários pelotenses investindo nesse setor, em Gramado, Nova Petrópolis etc.
Abraços, Gilvane Ferreira Garcia, 19/06/09 22:57
Fotos de F. A. Vidalquarta-feira, 10 de fevereiro de 2010
Autores locais apresentados no blogue
O de maior alcance e volume literário é Aldyr Garcia Schlee (dir.), que em dezembro passado lançou uma série de contos em torno ao nascimento de Carlos Gardel, Os limites do impossível (veja nota).
Schlee é jaguarense que reside em Pelotas desde os 15 anos de idade, e seus conteúdos são habitualmente focados na fronteira com o Uruguai ou no país vizinho. Inclusive os uruguaios o têm como escritor nacional deles. Sua carreira profissional se situa no jornalismo e na docência universitária, começando na literatura de ficção somente após os 40 anos de idade.
Vítor Ramil (esq.) é conhecido nacionalmente como cantor há 30 anos, e lançou um segundo romance em 2008: "Satolep" (leia nota), obra de longa preparação e de complexos conteúdos, fruto de obsessivos amores por Pelotas, sua cidade-natal. Nem Ramil nem Schlee pertencem a agrupações literárias, por opção.
Entre os membros da Academia Pelotense de Letras, Manoel Soares Magalhães tem-se mostrado como romancista, poeta, pintor e blogueiro, com surpreendentes resultados ao conjugar diversas artes e gêneros discursivos. O colega de sodalício Francisco Dias da Costa Vidal, cronista de jornais desde os anos 50 e psicólogo desde os anos 60, apresentou em 2008 sua segunda coletânea de relatos de viagem, desta vez um retorno aos veraneios dos anos 40 no balneário do Hermenegildo, de Santa Vitória do Palmar, município mais austral do Brasil.
Marlise Flório Real (dir.) é psicóloga, vitoriense radicada em Pelotas, que publica crônicas sobre amor e sexualidade, e as reúne em livros. O último deles foi lançado em outubro de 2009.
O poeta Joaquim Moncks não publicou livros recentemente, mas tem vindo a Pelotas como integrante da Academia Sul-Brasileira de Letras, onde paraninfou o ingresso de um escritor. João Manuel Cunha é professor de literatura mas está mencionado neste blogue como escritor, pela simples façanha de ter sido citado num discurso de ingresso na Academia Brasileira de Letras, o do cineasta Nelson Pereira dos Santos (leia nota).
José Antônio Mazza Leite provém das ciências biológicas mas tem se dedicado à pesquisa histórica, especificamente sobre Pelotas. Em 2009 publicou um resumo justamente sobre a origem e desenvolvimento de nossa cidade.
Rubens Amador Filho é jornalista com talento para a ficção, especialmente os contos breves. Em 2008 criou um novo meio de comunicação em Pelotas, onde inventa personagens, colunistas e até notícias, buscando com teimosa rebeldia uma cidade futura que se resiste a ser reinventada, e que Ramil já descrevera num limbo, mundo ideal paralelo. Rubens apresentou duas obras em 2009, derivadas da produção no blogue Amigos de Pelotas, afinal também este uma obra literária.
Pablo Rodrigues é outro jornalista que publica somente crônicas e textos poéticos, mas cultiva um estilo de pureza e profundidade literária, nas pegadas de Guimarães Rosa.
Janaína Brum tem um blogue de poesia, o que em si mesmo não seria um destaque literário. Mas sua produção é disciplinada, criativa e baseada em estudos linguísticos. Outra jaguarense que enriquece nossa cidade com o verbo sonoro e delicado que sai de um coração sensível, peneirado por uma inteligência e uma boa capacidade artesanal.
Beatriz Araujo é porto-alegrense radicada em Pelotas há nove anos, e escreve na internet poemas dedicados com naturalidade ao amor, simplesmente. Sua primeira coletânea foi encarregada a uma editora virtual.
Nauro Machado Jr. diz que não é nem quer ser escritor; mesmo que seu livro sobre o Grêmio Esportivo Brasil seja um fenômeno de vendas em Pelotas. Ele é fotógrafo profissional e já tem mais ideias para contos e romances, o que o define, pelo menos agora, como um futuro escritor. Que seguirá sendo fotógrafo.
Anderson Reichow já publica crônicas, contos e reportagens na internet, com evidente talento. Sua primeira participação num livro ocorre nestes dias, como um dos nomes numa coletânea de artigos sobre direitos dos animais. Veio de Canguçu aos poucos e já é pelotense adotado, sendo o segundo mais jovem deste grupo de autores.
Em 2008, Júlia Thomaz (dir.) publicou contos breves, aos oito anos de idade (veja nota), e, mesmo que não saibamos sua direção profissional ou vocacional, é a mais precoce escritora jamais vista em Pelotas.
Fotos de F. A. Vidal
domingo, 7 de fevereiro de 2010
Entre o passado vivente e o futuro moribundo
Dois Textos Marginais, de Manoel Soares Magalhães. Pelotas: Livraria Mundial, 2009.
sábado, 6 de fevereiro de 2010
Nudismo como performance
Esta última, no último andar, concluiu com um gesto concreto-simbólico dos atores: tirarem a roupa e permanecerem nus no lugar, misturando-se aos visitantes como se também fossem observadores da exposição e em postura de ficar expostos à observação. O público, em maioria artistas, tolerou bem esta atuação, como quem trata com algo inofensivo. Toda atuação tem algum grau de exibicionismo, mas a nudez fora de contexto é chocante, de início, e aos poucos nos deixa algo novo em que pensar.
A pura nudez corporal nos recorda que somos animais, que por natureza não se vestem: ao ver bichos com roupas nos surpreendemos, e ante pessoas nuas - pressupondo a proibição de tocá-las - preferimos vê-las como se fossem animais. O gesto de despojar-se de tudo também mostrava a disposição dos atores à nudez da alma (abertura ao encontro humano sem pudores) e denunciava a nudez dos que andam vestidos (exibição social da personalidade).
O professor Pellegrin, coordenador-curador do evento, aprovou sem moralismo esta manifestação, que considerou poética. Ao ser questionado sobre o exibicionismo, ele enfatizou o significado das máscaras sociais, recordando que São Francisco de Assis ficou nu para entrar na vida espiritual. Evocou também o final do soneto de Vinícius São demais os perigos desta vida:
Uma mulher que é como a própria lua:
tão linda que só espalha sofrimento, tão cheia de pudor que vive nua.
Foto de Guitavares (Flickr)
sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010
Os troncos que atrapalham
Fotos de Guitavares (1) e F. A. Vidal (2)
quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010
Sambistas injetam ânimo no hospital
Em junho de 2002, Eduardo Brasil (de boné branco, nas fotos) operou-se neste hospital e sentia aquele nervosismo dos exames e a tensão das longas esperas. Além das complicações físicas, o silêncio fazia a vida ser um peso, e ele sentiu falta da música para distrair o tédio e animar-se de novo para a vida cotidiana. Uma vez dado de alta, ele convidou colegas sambistas – da Banda do Costinha, onde ele toca, e de outros conjuntos – para tocar e cantar uma hora por semana, e dar um pouco de esperança de viver aos que se sentem desanimados.
Uma funcionária da UFPel, familiar de Brasil, redigiu o projeto sob o nome Urutágua Tupã-í (em tupi, "Canção que vem de Deus") e a Universidade aprovou. Os músicos aceitaram o convite, escolheram o nome do grupo e o projeto não parou mais. O Medicação somente se constitui aqui no Hospital-Escola, e cada integrante toca em seus conjuntos de origem (alguns poderão ser vistos no concurso organizado pelo Diário Popular, neste fim-de-semana). [Veja nos comentários uma correção deste relato]
Sentido do projeto
Esta ideia espontânea – mas não única, pois outros grupos musicais e religiosos esporadicamente visitam o hospital – veio fazer parte de um grande projeto de bem-estar, onde se incluem a Ouvidoria, o Corredor Arte, a Internação Domiciliar para Oncologia, Campanha do agasalho, Combate ao fumo, Combate ao diabetes, Saúde na estrada (para caminhoneiros) e vários outros programas.
O objetivo geral é médico: amenizar o sofrimento e contribuir à saúde em sentido integral. O meio é musical, mas a atividade é uma espécie de oração ritual terapêutica, de conteúdo espiritual, corporal e coletivo. Os beneficiados são, supostamente, os definidos como doentes, mas a música chega a todos os que podem reconhecer e manifestar seus sentimentos.
Sendo uma atividade voluntária, não dá retorno algum aos integrantes (de fato, o hospital não lhes serve nem um copo d'água), mas o atual diretor providenciou vales-transporte para cada um do grupo, como reconhecimento de sua contribuição à saúde.
Quem vai na frente, mesmo não sendo parte do grupo, é Carla Carvalho (à dir. com crachá, no corredor da maternidade), a ouvidora do hospital, intermediária que acolhe queixas e sugestões da comunidade e as encaminha à direção institucional.
A função de Carla é levar o grupo pelos setores do hospital e ouvir as opiniões dos usuários. A presença dela, inclusive vestindo de branco, representa a aprovação do hospital e ajuda a conter a alegria dos músicos, que vai aumentando, com o sentido de mantê-los na missão. Poderia haver queixas - pois o projeto rompe com o tradicional silêncio e assepsia dos hospitais - mas Carla garante que nunca recebeu uma só reclamação.
Conduzem a harmonia Lauro Pereira no cavaquinho (esq.) e Rogério Silveira no banjo (dir.), que também escolhe as melodias na hora e é tido como o mais brincalhão e "bagunceiro", como ele mesmo se define (se deixassem, ele entraria em todos os quartos tocando). Ele é motor musical e alma do grupo.
Logo atrás, vão Eduardo Brasil no tantã e Miro Pedroso no pandeiro verde-amarelo, que são os mais antigos, fiéis ao projeto desde a fundação.
Na retaguarda, outros percussionistas marcam o ritmo que embala e mantém o ânimo elevado: Pierre Tavares (pandeiro), seu Amaro (tamborim) e seu Páuzio (chocalho).
As vozes não são trabalhadas nem eles têm estudos musicais, mas a unidade do grupo, a firmeza rítmica e o entusiasmo são contagiantes e avassalam todo pensamento negativo. No caminho, o objetivo é incluir todas as pessoas que quiserem mostrar sua alegria e, se for possível, facilitar a autossanação por essa alegria, por mínima que seja.
O trajeto dentro do hospital
O ritual começa cada quinta (exceto feriados), pouco antes das 15h, quando os músicos se concentram no bar defronte ao hospital, pela Rua Professor Araújo. Não ensaiam nem combinam nada, exceto a hora de chegar e a afinação dos dois instrumentos harmônicos. O trajeto pelos setores é um ritual que nunca muda.
O início é pela Oncologia, onde há exames de câncer e pacientes em quimioterapia (esq.). Os músicos já sabem que a recepção aqui será a menos fácil – mesmo que não de rejeição – e por isso entram com muito respeito, sem perder a necessária ousadia. Como agentes de saúde, eles sabem que depois da injeção vem o alívio.
O passeio pela Oncologia é uma surpresa para os usuários, pois a maioria deles está ali por primeira vez, e até caras de espanto se veem naqueles que têm uma doença grave e não esperariam uma serenata em pleno dia. Com certeza, todos já viram um conjunto vocal alguma vez, mas não numa situação tão séria. O impacto é como o de quem vê Papai Noel, achando que não existia. Mas logo vem a aceitação. O princípio desta terapia emocional é que se o corpo sorrir primeiro, a alma sorrirá depois: no momento seguinte, ou dias mais tarde – é questão de tempo.
Brasil acena aos pacientes fazendo com a mão um gesto de força; alguns respondem timidamente, mas a sensação geral é de que o salão de espera se transformou num palco. Dores e tristezas ficam suspendidas. Fotógrafos de celular vão atrás e registram as cenas. O grupo, no entanto, não se detém em momento algum (as máquinas fotográficas precisam ser rápidas).
Saindo dali, o grupo de repente faz silêncio: estamos passando pela U.T.I da Pediatria, que é norma respeitar. Ainda no mesmo setor, a música é retomada e algumas crianças vêm ver o desfile (dir.). Elas também são tomadas de surpresa, mas acreditam logo no que veem. Sorriem com aprovação, mesmo não se somando à festa.
O ritmo não será mais interrompido, nem sequer subindo e descendo as escadas (primeiras fotos acima). Na maternidade, a visita não causa tanta surpresa e é implicitamente recebida como uma homenagem à vida e aos bebês que estão por nascer. O sentido amoroso fica mais claro, neste encontro entre visitantes homens e pacientes mulheres, que mesmo internadas não estão enfermas.
É na Clínica Médica, a seguir, que a alegria começa a transbordar: aqui o grupo entra num quarto com liberdade (foto abaixo) e no corredor alguns funcionários dançam junto com pacientes. Vários participam acompanhando o cordão.
Aqui é onde se pode ver melhor o que Chico Buarque descreveu na música A Banda: as individualidades das almas são despertadas, vivem uma união aparente e, no final, guardam parte desta ilusória alegria para seguir vivendo.
Neste setor há dois tipos de reação: quem já conhece o grupo – por estar ali hospitalizado há mais de uma semana – se encanta pela visita esperada, e os "novos" arregalam os olhos por uns minutos e, mesmo não sambando, gradualmente vão desenhando um sorriso. O espírito muda a direção do pensamento, como foi o caso da moça com soro que estava sentada no corredor: ela foi incentivada a seguir a banda (uma pessoa levava o soro levantado - foto acima) e, em minutos, seu ânimo e sua atitude eram as de uma pessoa que havia esquecido seu estado físico. A terapia mostrava seus efeitos.
Depois de 40 minutos, o clima de festa estava instalado e não havia reclamações. Mas acabou-se o que era doce e o trabalho continua: dentro do hospital e fora dele. Mesmo sem muita organização e sem financiamento, os objetivos foram alcançados, que é o importante.
Se o projeto for avaliado em detalhe, se verá beneficiado de algum tipo de planejamento: na preparação vocal, na escolha das letras ou de vestimentas uniformes. Os integrantes não têm aspecto de artistas nem de enfermeiros, apesar de unir as duas funções. No grupo Medicação, por agora, a disciplina unificadora é a do ritmo, e o entusiasmo transborda até precisar dizer: "Por hoje chega, até a próxima quinta".
Fotos de F. A. Vidal (21 jan)
Vídeos: H. Schwonke, Completa Comunicação (14 jan)
terça-feira, 2 de fevereiro de 2010
Fórum Social Mundial chega às periferias
O Fórum Social Mundial, iniciado há dez anos em Porto Alegre, já rodou pelo mundo e agora tem uma primeira versão expandida às periferias urbanas. Contraposto ao Fórum Econômico de Davos, o Fórum Social é uma rede mundial de resistência contra o capitalismo. A Glocalização se opõe à globalização.
Em Pelotas, as atividades foram organizadas no Loteamento Dunas, de 2 a 6 de fevereiro. Veja a programação. Outras informações no Diário da Manhã de hoje e no blogue da Rede Vidadania.