O impulso navegador é a curiosidade de viver. E, na passagem da vida, o barco que nos leva é o tempo, Cronos, esse carrasco inclemente. Ao lado dele, a estagnada realidade chega a ser um alívio.
Barco na praia do Laranjal, domingo 23-9-12 |
Domingo pela manhã um barco lutava contra as ondas da lagoa. Tal embate revolveu os escaninhos da memória, onde uma gaveta se abriu e eu me enxerguei marujo. Sim, marinheiro. Talvez em razão da ascendência portuguesa, um povo sabidamente navegador. Uma de minhas brincadeiras preferidas era fazer barquinho de papel e jogá-los nas sangas. Fitava-os por longos minutos, até vê-los desaparecer nos recantos sombrios do córrego, levados para longe, lugar desconhecido que, em sonho, eu visitava.
Pois domingo essa memória retornou. Tomando chimarrão à beira da lagoa, na companhia de minha esposa, a artista plástica e arquiteta Carmen Garrez, permaneci algum tempo fitando a embarcação, que balouçava, a mercê das ondas. Em razão de sua pequenez, as vagas eram imensas e sinistras. Evidentemente que me coloquei no tombadilho do barco, sentindo no rosto os respingos da água fria. O coração rufava; olhar na linha do horizonte, presa de frenesi, na expectativa de uma visão, antevisão, de uma descoberta fascinante.
As ondas cinzas, cada vez mais altas, davam ideia de que a qualquer instante iria engolir a pequena embarcação, oferenda à Mãe Iemanjá. Girava sobre si mesmo, não sabendo para onde ir. Bem, talvez a ideia fosse essa, deixar-se levar ao sabor da crença, ao sabor da sorte. Bom que seja assim, caso contrário perderia a graça. É como soltar barquinhos de papel na sanga, na crença de que sejam fortes e resistentes às ondas, e que o destino que lhes aguarda é venturoso.
Fechei a gaveta da recordação, pois a vida tinha de seguir. O domingo, como hipotético barco navegando em outro espaço-tempo, tinha de ir avante. Emaranhar-me em seus invisíveis fios era o destino inarredável. . E foi o que fiz, convicto de que, talvez um dia, sedento por irresistível impulso de navegador, eu reabra a gaveta da lembrança e tire dela o barquinho solitário, balouçando nas ondas da lagoa num frio domingo primaveril.
Pois domingo essa memória retornou. Tomando chimarrão à beira da lagoa, na companhia de minha esposa, a artista plástica e arquiteta Carmen Garrez, permaneci algum tempo fitando a embarcação, que balouçava, a mercê das ondas. Em razão de sua pequenez, as vagas eram imensas e sinistras. Evidentemente que me coloquei no tombadilho do barco, sentindo no rosto os respingos da água fria. O coração rufava; olhar na linha do horizonte, presa de frenesi, na expectativa de uma visão, antevisão, de uma descoberta fascinante.
As ondas cinzas, cada vez mais altas, davam ideia de que a qualquer instante iria engolir a pequena embarcação, oferenda à Mãe Iemanjá. Girava sobre si mesmo, não sabendo para onde ir. Bem, talvez a ideia fosse essa, deixar-se levar ao sabor da crença, ao sabor da sorte. Bom que seja assim, caso contrário perderia a graça. É como soltar barquinhos de papel na sanga, na crença de que sejam fortes e resistentes às ondas, e que o destino que lhes aguarda é venturoso.
Fechei a gaveta da recordação, pois a vida tinha de seguir. O domingo, como hipotético barco navegando em outro espaço-tempo, tinha de ir avante. Emaranhar-me em seus invisíveis fios era o destino inarredável. . E foi o que fiz, convicto de que, talvez um dia, sedento por irresistível impulso de navegador, eu reabra a gaveta da lembrança e tire dela o barquinho solitário, balouçando nas ondas da lagoa num frio domingo primaveril.
Manoel Soares Magalhães
Veja aqui outra miniatura de Alfredo Lisakovski. |
Um comentário:
Grato pela lembrança, caro amigo.
Grande abraço!
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