No Salão Nobre da Prefeitura (esq.), os prefeitos de Pelotas não renunciam a seus retratos fotográficos, nos últimos 120 anos (veja o post). Já para um retrato mais autoral se requer maior compreensão da linguagem das linhas e das cores.
Quando Sir Winston Churchill era um dos mais destacados membros do Parlamento Britânico, no auge da sua popularidade, certo pintor de relativo nome desejou homenageá-lo oferecendo-lhe uma pintura alentada em dimensões, a qual, no entender do artista, seria uma obra que ficaria como uma espécie de logotipo de Churchill. Foi preparada uma sessão especial para o descerramento da pintura ante todos os pares de Sir Winston. A expectativa era enorme.
Chegado o momento da retirada do manto que envolvia a pintura, Sir Winston, como mandava o protocolo, puxa a referida cobertura e surge a figura imponente de um varão.
Nota o homenageado que passa um frisson pela seleta platéia. Há um certo desconforto, pois - pela quase unanimidade - a pintura não revelava em nada os traços marcantes do grande estadista. Este, ante o quadro, olhando-o, e virando-se para os demais presentes, ele também decepcionado e indignado, britanicamente falou (ele, Churchill nas horas vagas tinha na pintura o seu hobby preferido):
— Meu caro pintor e colega, devo confessar-lhe que sinto que não me pareço com o retrato feito pelo ilustre pintor. Desagradou-me tanto, devo confessá-lo, que não pretendo levá-lo para casa, menos ainda permitir que seja exposto numa parede do Parlamento, como aventaram alguns generosos colegas. Penso nos tempos em que meus pósteros não venham a me reconhecer, tal como eu neste momento e, parece, todos os meus colegas. Agradeço a homenagem, mas declino dela.
A sessão foi encerrada e do pintor nunca mais se ouviu falar.
Lembrei esse episódio a propósito de um fato ocorrido esta semana no Brasil: um artista que nunca ouvi falar, chamado Romero Britto, pernambucano, para publicar o quadro que pintou da presidenta Dilma Rousseff, pagou de seu bolso, como matéria paga, 20 mil dólares, como noticia a imprensa (Correio do Povo, terça-feira 15-02-11).
Pois este jovem pintor, amante das cores berrantes, sem a arte de um Andy Warhol ou de uma Frida Kahlo, trajando um terno verde-limão, esquisito para nossos padrões, solicitou uma audiência e fez pessoalmente a entrega da pintura feita por ele, que, cá para nós, em nada se parece com a retratada: num estilo plano único, como as fotos bizantinas, cabelo lembrando um turbante da Carmem Miranda, na face sorridente há marcas em cada bochecha que, para mim, não traz nada de arte e nada representam.
É bem verdade que a foto do Correio do Povo (dir.) mostra uma Dilma dizendo algo para o pintor (ameaçando-o? — pois traz um dedo erguido em situação que lembra um proctologista). Desculpem a comparação, mas achei tão ruim a oferenda, de tão má qualidade — apesar das amizades apregoadas de S. Sª, o pintor, na nota — que fiquei pensando: Onde será que a Presidenta vai colocar tal retrato?
Juro que nessa hora não desejava ser o secretário da Presidenta...
4 comentários:
Olha, eu lamento que o cronista não conheça Romero Britto. O problema não é do artista - aliás, bastante reconhecido no mundo das artes -, mas de quem desdenha dele ao dizer desconhecê-lo. Destaque-se, ainda, que uma mera busca da internet ajudaria: o artista tem site oficial e é largamente referenciado.
Na verdade, o cronista não gosta, assumidamente, do estilo desse pintor mas também não fala como especialista. Nem quer ser politicamente correto, buscando apimentar o texto opinativo. Mas veja só: ao "falar mal" da obra, já se lhe deu um destaque.
Aqui no blogue já tínhamos uma referência a Romero Britto (num post sobre Rita Westendorff) mas sobre preferências há variedade e para criticar há liberdade. O leitor do blogue é que julga se as críticas são suaves ou destrutivas. No caso deste pintor, eu aconselho revisar sua biografia, um modelo do uso da criatividade para se resgatar como pessoa.
Nesta crônica, a intenção literária é nos fazer pensar: quando recebemos um presente podemos rejeitá-lo, como fez o Churchill (conta-se que foi a mulher dele que pôs no fogo), ou devemos fazer vista grossa, suspendendo a crítica, sem olhar o dente do cavalo dado? Talvez quem olhe o dente busca o valor financeiro, mas quem vê o coração não veja o valor real do presente.
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