quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Conservatório de Música precisa de conservação

O músico, compositor e diplomata pelotense Luiz Carlos Lessa Vinholes escreveu o artigo abaixo, com algumas recordações do Conservatório de Música na década de 1950. A Casa fundada em 1918, municipalizada nos anos 30, e depois gradualmente incluída na UFPel, se encontra hoje como uma unidade menor, dependente do Centro de Artes, e com aulas espalhadas por quatro sedes da Universidade.

Também está negligenciado o tradicional prédio do século XIX onde já por 96 anos funciona este símbolo cultural em Pelotas e bastião da música erudita. Há seis anos, a Universidade adquiriu piano novo e iniciou reforma do auditório (v. postagem); há cinco, comprou novas cadeiras (leia postagem de 2009) e, há quatro, a Prefeitura repintou as fachadas (v. postagem de 2010).

Faltou, no entanto, restaurar a estrutura do velho casarão e o Salão Milton de Lemos teve que ser interditado, em 2012. A nova reitoria tenta manter atividades no local, mas a propriedade ainda é do município e os custos de conservação são muito altos. Veja recente reportagem da RBS sobre o Conservatório de Música da UFPel.

Salão Milton de Lemos em 2011, antes da interdição, já com as novas cadeiras
(hoje estas cadeiras se encontram no auditório da Lobo da Costa, sede Canguru).

O Conservatório de Música é ícone de Pelotas

Tiro da estante pequeno álbum que há décadas guarda parte da história de 1952 do Conservatório de Música de Pelotas. Suas páginas têm fotos, programas e dedicatórias de intérpretes que se destacaram no cenário mundial de meados do século 20.

Para mim este álbum é muito especial, pois, com minha ida definitiva para São Paulo em 1953, ele passou a ser, sem que eu quisesse, testemunha da despedida de minha cidade natal.

Folheando suas páginas, entre tantos outros, vejo e recordo a:
    Conservatório ficou com um dos seus 3 pianos de concerto
    e nenhuma cadeira no auditório (foto de 2014).
  • Anselmo Zlatopolsky, violinista nascido na Rússia, que veio “em tenra idade para o Brasil, onde mais tarde obteve sua naturalização” tornando-se spalla do Quarteto Haydn, que Mário de Andrade criou quando fundou o Departamento de Cultura de S. Paulo; 
  • Nicanor Zabaleta, o harpista espanhol considerado “o primeiro harpista do mundo” (v. biografia) depois de apresentar-se aos nove anos de idade, estudar em Paris com Marcel Tournier e ser solista das mais experientes orquestras do Velho Continente; 
  • o pianista Sebastian Benda, nascido na França, “descendente da dinastia de músicos iniciada no século XVIII, incluindo Franz e George Benda, compositores da corte de Frederico o Grande” (leia neste blogue crônica sobre Benda, escrita em abril de 1953;
  • Guido Santorsola, italiano de nascimento, exímio executante de viola da gamba (v. Wikipedia), que no Brasil foi aluno de violino de Zaccaria Autuori e de composição com Agostinho Cantú, no Conservatório Dramático e Musical paulista, falecendo em Montevidéu, depois de desenvolver intensa atividade como compositor e regente no Teatro Sodre
  • o Trio Pró-Arte formado por Maria Amélia de Resende Martins, piano, George Retyi-Gazda, violino, e Jacques Ripoche, violoncelo, ela uma das responsáveis pela fundação, na década de 1940, da Sociedade Pró-Arte, no Rio de Janeiro, que, empresariando grandes artistas, promoveu recitais e concertos de parceria com instituições das principais cidades do Brasil; 
  • Walter Gieseking, pianista francês nascido em 1895, aluno de Eugenio Gandolfo, que viu sua carreira interrompida com a guerra de 1914 e que mais tarde, embora contra sua vontade, teve que tocar para Adolfo Hitler (v. Wikipedia).
De Sebastian Benda vale lembrar que foi diretor do Departamento de Música da Universidade Federal de Santa Maria e, mais tarde, do mesmo departamento da Universidade Federal da Bahia. Também em 1952, sob a regência de H. J. Koellreutter, conhecido mestre de compositores brasileiros, tais como Claudio Santoro, Edino Krieger e Guerra Peixe, Benda foi solista da orquestra da Sociedade Orquestral de Pelotas. Koellreutter, por sua vez, regeu o Coral do Conservatório apresentando a singular cantata “Negrinho do Pastoreio”, para vozes femininas, de Eunice Catunda, anos depois regida por Lourdes Nascimento, mestra de gerações de cantoras e cantores pelotenses.

Lendo notícias recentes, tomei conhecimento das tratativas que visam retirar o Conservatório do local que ocupa. Preocupa-me, pois se não levarem em consideração o seu passado, destruirão parte da história de Pelotas, em prejuízo das gerações futuras. O Conservatório, no prédio em que se encontra há quase um século, é ícone da Princesa do Sul.
Luiz Carlos Vinholes

Projeto PROFORMUS, do Conservatório, promove recital esta quarta (27-08), 19h, na Biblioteca Pública.
Texto: Diário Popular
Fotos: ASCOM (1), RBS (2), Facebook (3)

POST DATA
3-09-14
Leia reportagem Conservatório recebe apoio da Câmara.

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