Na ocasião, o psiquiatra Hémerson Ari Mendes foi convidado para tratar um tema de sua preferência e, sem sair dos limites da prática psicanalítica, abordou um tema lúdico e pedagógico para os psicoterapeutas e interessados na área "psi".
Tenista amador e, na época, professor de Psicologia Médica na UFPel, Hémerson brincou com a comparação entre uma partida de tênis e um encontro terapêutico, transmitindo seu entusiasmo pela ciência, pelo ensino, pelo esporte e pela arte... da psicoterapia.
Sempre com fluência e bom-humor, o psicanalista-tenista explicou umas 50 semelhanças entre ambas atividades, dando exemplos práticos e pessoais, tudo sem ler notas nem fazer pausa alguma, no ritmo de um “lançamento” a cada 90 segundos.
Já distante do agitado campo de jogo, pois a palestra também pareceu uma partida de tênis, reli os apontamentos e fiz uma tentativa de classificação, que a seguir transcrevo, ficando-me a impressão da coerência e interesse dos conteúdos.
Os paralelos são mais evidentes entre a sessão psicológica e a partida de tênis, duas formas de diálogo humano e real, sob certos limites e normas:
- Ambas são encontros entre duas partes,
- situadas frente a frente,
- em um setting (enquadramento) espacial e temporal.
- A interação é mental nos dois casos, com a bolinha representando o foco das idéias verbalizadas, na alternância da palavra.
- Mas ela é também, inevitavelmente, corporal e sensorial;
- se feita virtualmente, perde seus benefícios (detalhe não mencionado na palestra).
- É preciso um adestramento mecânico (bater bola/bater boca), mas o jogo consiste em fazer pensar, conhecer o outro, provocar mudanças.
- A duração de ambos, breve ou longa, depende das ações de cada participante – criativas, agressivas ou defensivas.
- A relação terapêutica precisa equilibrar o uso da força (nos dois participantes), assim como o tenista segura a raquete: nem com muita dureza que prejudique o vínculo, nem afrouxando demais que este se dilua.
- A mão deve aplicar um peso, fazer sentir uma pressão (para evitar a derrota pela neurose), mas só até certo ponto, pois uma ação violenta gera reações parecidas (defesas neuróticas ou psicóticas).
- Ambos processos conjugam a empatia mútua (atirar a bola para que o outro a apanhe, como no frescobol, jogo mais típico de namorados) com a existência de dificuldades e desafios (construir uma jogada nova, para que o competidor responda à exigência e, se puder, se saia bem).
- Na terapia e no tênis, há um prazer inerente ao jogar, mesmo que não se ganhem pontos.
- ambos têm objetivos e preferências pessoais, que às vezes interferem na aprendizagem ou na terapia.
- Um aprendiz e um neurótico querem adquirir recursos adaptativos para chegar a suas metas.
- Aluno e paciente podem ver o orientador como um modelo a seguir na vida, o que facilita simpatias e antipatias específicas.
Na atividade em si mesma, também há semelhanças entre o que o jogador e o terapeuta fazem: alguns seguem fórmulas, enquanto outros fazem as coisas sem consciência dos detalhes, na base dos talentos naturais. Para não errar, é preciso olhar a bola-foco (ao recebê-la), enquanto nos lançamentos a visão deve concentrar-se no objetivo.
Após um debate com os assistentes, Hémerson deixou uma instigante idéia para pensar: O jogo não termina; é importante manter-se nele, pois sempre há mais jogadas, mesmo que nos sintamos momentaneamente perdidos.
Na palestra não se mencionaram diferenças entre o esporte e a terapia, mas elas existem e são importantes: os jogadores competem um contra outro em busca de um troféu, o tênis ocorre geralmente com público olhando e torcendo, há campeonatos e hierarquias de tenistas mas não de psicólogos, na terapia os participantes não podem alternar entre análise e relação sexual.
Estes e outros paralelos entre o tênis e a vida mental humana podem ver-se no filme inglês Wimbledon, de 2004. Em português chamou-se “O Jogo do Amor”, nome que para nós já é uma alusão ao encontro terapêutico.
Fotos da web
Um comentário:
Boa matéria! E eu perdi a palestra... Bah!
Bj, Tê!
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