domingo, 1 de julho de 2012

A Cidade do Tinha

Marilena Lopes Gonçalves, graduada em Filosofia pela UFPel, publicou a seguinte crônica no Diário Popular (veja a nota). O texto alfineta as atitudes pessimistas e confrontacionais em relação a uma cidade, e desafia os cidadãos a unirem forças para sair do "estado de guerra" e construir uma paz verdadeira. A autora é natural de Piratini (veja outro artigo seu) mas suas palavras podem ser vestidas por outras cidades.


Conheci um lindo lugar que se chamava “Terra do Tinha”. Sua história conta que há muitos anos lá tinha teatro, tinha cinema, tinha jornal, tinha fábrica de cerveja, de fogos, tinha uma pecuária e agricultura muito ricas. Serviu até de entreposto comercial para cidades, hoje maiores, cuja situação se inverteu. Tinha uma porção de coisas, que agora não tem.

Lá acredita-se que viveram grandes e famosos heróis. Dizem que foi muito politizada em outros tempos. Mas uma grande e longa guerra devastou aquelas terras. Seu povo passou a viver das lembranças desta guerra, como se fosse a melhor coisa que lhes tivesse acontecido. Como se guerra fosse motivo de orgulho e veneração.

Independentemente da causa que a tenha motivado, que por sinal não foi nobre, só favoreceu as elites da época, assim como só a estas condecorou. Guerra é guerra. Traz apenas desgraças. E como as trouxe! Pagam alto preço por ela até hoje.

Preservar a história como fonte de cultura é válido. Estranho é venerar uma triste história de destruição e dor, que dilacerou tantas vidas.

Este povo vive do passado e está sempre dividido. Acostumou-se a brigar entre si. Acredita-se que é um estigma herdado dos antepassados. Tem olhos voltados apenas para o outro e não para a frente; lutam separados, por isso são frágeis. Move-se por paixões e, como sabemos, as paixões cegam, são más conselheiras.

Alguns até tentam mudar o nome da cidade para “Prosperidade”, mas sempre que surge algo novo ameaçando mudar sua realidade, a outra metade reage e se arma para lutar contra. Em época de eleição, referem-se uns aos outros como “os nossos e os deles”. Até vizinho de porta tratam-se como inimigos. Esqueceram que a política nasceu da necessidade de se buscar o melhor para a coletividade.

Na Terra do Tinha fizeram grandes plantações de eucalipto, o que torna a terra estéril. Ninguém se arvorou de defensor da natureza na época, como fizeram recentemente, por motivos, se comparados, de proporções insignificantes.

Creio que enquanto se virem como possíveis oponentes, em vez de olharem para a frente, na mesma direção, não conseguirão progredir.

Como Thomas More, também tenho uma utopia. Se alguém identificar a Terra do Tinha pela minha descrição, estará me dando razão e, como diz o ditado, vestindo a carapuça. Se não a reconhecerem, então devo estar errada, porque é sinal de que só eu a vejo assim.

Continuarei sonhando com uma utópica cidade ideal, onde a opinião dos demais é respeitada e ninguém é visto como melhor ou pior por divergir. Onde os habitantes não lutam entre si, por motivos infundados, mas juntos, buscando soluções melhores em vez de críticas vazias que não levam a nada.

Uma cidade não dividida em “os nossos e os deles" e sim em “nós”, os habitantes da “nossa cidade”. Afinal, só a união faz a força.
Fotos: Ailton Lopes (2), blogue Educação Ambiental (3)

Um comentário:

Renato de Tróia disse...

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