Em 1972, na 5ª série, tive uma professora de Português – aliás, "Língua Nacional", que era o nome da disciplina no primeiro ano da Reforma do Ensino – que sentia um orgulho imenso de sua cidade natal. Era a Dona Constança. Acho que não havia uma só aula com ela em que não ouvíamos falar de Pelotas. O assunto podia ser pronomes, verbos, objetos diretos e/ou indiretos, que invariavelmente entrava Pelotas no meio.
Certa vez ela pediu que escrevêssemos sobre a localidade onde havíamos nascido, abrangendo vários itens. Um deles era se a cidade em questão era bem traçada. Uma colega que vinha de São Paulo comentou em voz alta que iria responder "sim" a essa pergunta. A professora contestou na hora. São Paulo não é bem traçada, imagina! Nem Porto Alegre é, que dirá a capital paulista. Cidade bem traçada é Pelotas! Aí ela falou uma frase que eu nunca esqueci:
– Em Pelotas a gente olha para uma rua e enxerga o fim!
Eu tinha estado em Pelotas rapidamente no ano anterior, mas não observei essa característica. Voltei lá em 1974 e desta vez resolvi conferir. Espichei o olho em uma das ruas e, dito e feito, enxerguei o final. Não é possível! Dona Constança não exagerou! Guardei mais essa recordação por todos esses anos, mas prometi a mim mesmo que, se voltasse a Pelotas, faria mais uma verificação.
Pois no sábado passado, mais uma vez, pus-me a conferir o prumo das ruas de Pelotas. E constatei que elas não empenaram nem um milímetro. Continuam tão retas quanto em 1974.
Quando estávamos para ir embora, pedimos orientação de como chegar à saída para a estrada. Disseram-nos que deveríamos pegar a mesma rua do nosso hotel e ir em frente "até o fim". Foi o que fizemos. Seguimos por várias quadras em linha reta. Quando terminou a rua, terminou Pelotas. Dona Constança tinha razão. É por isso que a letra de "Pelotas", de Kleiton e Kledir (veja o post, penúltima estrofe), diz:
– O meu amor não tem fim / como uma rua infinita.
Fotos: F. A. Vidal e R. Marin
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