Redigir títulos de livros, artigos e notícias é uma arte nada simples. É preciso jogar com o espaço disponível, o poder de síntese, o sentido da verdade, a complexidade dos fatos, a exatidão do texto e a composição de sonoridades.
O Manual de Estilo do Estadão (3ª edição, 1997) traz 60 instruções para redigir títulos, e esses critérios são seguidos pela imprensa nacional. Pelo menos existe a tentativa.
Existem os deslizes involuntários, mas às vezes podemos pensar que também existe uma arte de cometer erros, a julgar por fenômenos como o que vamos analisar. Quantas falhas de redação podem caber em 4 palavras? Vamos comprovar essa arte com ajuda do Manual do Estado de S. Paulo (leia aqui).
O título de uma notícia de hoje em Pelotas (confira a matéria) diz:
O texto tenta esclarecer:
Mas a verdade é que o texto e seu título deveriam ser reescritos totalmente, tal a má qualidade.
Com o título acima (em azul), o leitor saberá o sexo da vítima mas não o da pessoa atacante. Um homem esfaqueou uma mulher, ou uma mulher atacou outra? [2]
Lendo o corpo da matéria, um brasileiro comum entenderá que a adolescente A viu o namorado dela em companhia da adolescente B e, talvez para vingar uma imaginada traição, atacou esta última a facadas. No entanto, a sentença acima citada não esclarece se o namorado era de A ou de B [3], e ainda introduz uma segunda "outra" (seria C ou a mesma B?). A atacante queria vingar a traição própria ou a da amiga? [4]
Um bom título jornalístico deve golpear a curiosidade do leitor em poucas palavras, com a precisão e a elegância de um bisturi. Não deve confundir ou incomodar o leitor, nem perder o foco da informação (neste caso, a violência entre jovens, um problema de dupla gravidade).
Imagens da web
O Manual de Estilo do Estadão (3ª edição, 1997) traz 60 instruções para redigir títulos, e esses critérios são seguidos pela imprensa nacional. Pelo menos existe a tentativa.
Existem os deslizes involuntários, mas às vezes podemos pensar que também existe uma arte de cometer erros, a julgar por fenômenos como o que vamos analisar. Quantas falhas de redação podem caber em 4 palavras? Vamos comprovar essa arte com ajuda do Manual do Estado de S. Paulo (leia aqui).
O título de uma notícia de hoje em Pelotas (confira a matéria) diz:
Adolescente esfaquea uma jovem
O texto tenta esclarecer:
Uma adolescente esfaqueou outra jovem, também menor de idade, após encontrar o namorado com outra.Sobre o verbo [esfaquea], informei ao jornal a necessidade de corrigir para esfaqueia [erro 1]. O redator quis enfatizar tanto a violência entre jovens, fato preocupante na atualidade, que tropeçou também na correção verbal. Verbos terminados em EAR exigem um "i" quando a sílaba tônica cai fora da raiz verbal, transformando o "e" em ditongo (induz o leitor desavisado a pensar mal: teria o Acordo abolido o ditongo fechado EI?).
Desenho de Fadri |
Com o título acima (em azul), o leitor saberá o sexo da vítima mas não o da pessoa atacante. Um homem esfaqueou uma mulher, ou uma mulher atacou outra? [2]
Lendo o corpo da matéria, um brasileiro comum entenderá que a adolescente A viu o namorado dela em companhia da adolescente B e, talvez para vingar uma imaginada traição, atacou esta última a facadas. No entanto, a sentença acima citada não esclarece se o namorado era de A ou de B [3], e ainda introduz uma segunda "outra" (seria C ou a mesma B?). A atacante queria vingar a traição própria ou a da amiga? [4]
A adolescente estava na moto com um rapaz, quando a atual namorada, encontrou os dois e esfaqueou a jovem nas pernas e no peito.Agora sabemos que A queria vingar a si mesma, mas nos perguntamos se a namorada era do rapaz ou da agressora [5]. Hoje em dia, esta dúvida é politicamente correta, mas o leitor comum (sem esta tendência moderna) entenderá que o jornalista usa a premissa heterossexual, e desculpará outras falhas:
- Verbo no presente: como artifício para dar força à manchete, o Manual indica que normalmente se use o presente do indicativo, mas neste caso o verbo "esfaquear" impacta de tal forma, por si mesmo, que poderia ir no pretérito (esfaqueou). A obsessão pelo tempo presente [6] seria inadmissível no caso da morte de Getúlio (dir.). O tempo passado significa "está passado, não pode repetir-se". "Tenta suicídio" é uma coisa; "suicida-se" é outra.
- Artigos: o primeiro foi suprimido, prejudicando a informação (um adolescente ou uma adolescente?), e o segundo foi poupado [7], sugerindo a importância da quantidade ("uma jovem" foi esfaqueada, não mais).
Adolescente esfaqueia rival
Menina vingou-se a facadas
Por namorado, jovem fere outra
Adolescente foi agredida por outra
Jovem esfaqueada por namorar
Menina vingou-se a facadas
Por namorado, jovem fere outra
Adolescente foi agredida por outra
Jovem esfaqueada por namorar
Um bom título jornalístico deve golpear a curiosidade do leitor em poucas palavras, com a precisão e a elegância de um bisturi. Não deve confundir ou incomodar o leitor, nem perder o foco da informação (neste caso, a violência entre jovens, um problema de dupla gravidade).
Imagens da web
Nenhum comentário:
Postar um comentário